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Baluarte da Fortaleza de São José de Macapá e a pobreza na Amazônia na espátula do pintor Olivar Cunha |
BRASÍLIA, 21 DE MAIO
DE 2025 – O escritor que mais traduziu a identidade amapaense foi Fernando
Canto, poeta, contista, cronista, compositor e sociólogo, mestre em
Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Amapá (Unifap) e doutor
em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Com o objetivo de
defender a Amazônia de ataques estrangeiros, o império português ergueu no
Amapá o maior forte colonial do Brasil, a Fortaleza de São José de Macapá. Isolados
do resto do país pelos rios Amazonas e Jari, os amapaense defenderam o
Setentrião da França, que queria ampliar o território da Guiana Francesa.
Assim, a Fortaleza de São José de Macapá se tornou o maior
símbolo de que a Amazônia brasileira é do Brasil, e não das potências
hegemônicas, como atualmente está acontecendo, quando o presidente Lula da Silva
(PT), no seu afã de instalar uma ditadura comunista no Brasil, já cedeu até
mina de urânio na Amazônia para a China, uma das mais sangrentas ditaduras no
planeta.
A capacidade que os amapaenses demonstraram de expulsar os
franceses do Amapá e a resiliência ao isolamento são dois elementos que compõem
a identidade amapaense. O terceiro elemento está ligado à construção da
Fortaleza, que é a tradução perfeita de Macapá, a capital.
Construída por escravos negros e índios, a Fortaleza foi o
cadinho no qual se forjou a etnia macapaense. Os portugueses cruzaram com os
africanos e geraram mulatos, e fornicaram com os índios, formando uma população
de mamelucos; os africanos fundaram o distrito de Curiaú e o bairro do
Laguinho, misturaram-se com os índios e legaram cafuzos; e mulatos, cafuzos e
mamelucos se misturaram, fechando o círculo, numa diversidade étnica viva nas
ruas de Macapá, nas nuanças de peles que vão do alabastro ao ébano, passando
pelo bronze e jambo maduro, unidos pelo sotaque caboco: a fusão do português
falado em Lisboa, doces palavras tupis, línguas africanas, patoá das Guianas,
tudo triturado em corruptela.
Fernando Canto conseguiu refletir essa realidade para sua
torrencial obra literária, sobretudo a ensaística. Sua tese de mestrado, Fortaleza de São José de Macapá – Vertentes discursivas e as cartas dos construtores, publicada pela editora do Senado
Federal, é um raio-X do ícone amapaense. Já sua tese de doutorado, Literatura das Pedras – A Fortaleza de São José de Macapá como locus das identidades amapaenses, também publicada pelo
Senado, refere-se à “permanência esfíngica da Fortaleza de São José de Macapá,
ali na paisagem, à beira do rio”.
Na introdução de Literatura
das Pedras, Fernando Canto avisa: “O meu objeto propriamente dito é a Fortaleza
de São José de Macapá, a literatura e a identidade, pois trabalhei no processo
de como as identidades amapaenses se constroem a partir da literatura de
autores que são ou que tenham representado a ordem (o Estado) e os da
contraordem e suas oposições ao discurso do Estado, tomando como referência a
Fortaleza de São José de Macapá. Essa literatura tem os seus períodos
específicos aos quais chamo de temporalidades literárias para situar
metodologicamente o tempo de suas criações”.
Na sua pesquisa, Fernando Canto destinou algumas páginas de Literatura das Pedras ao romance A Casa Amarela, deste autor: “O trapiche
Eliezer Levy, defronte ao Macapá Hotel, avança no rio Amazonas como o calçadão
de uma avenida. As embarcações de passageiros ou de carga que atracam e partem
vêm geralmente de Belém, do Marajó e do Baixo Amazonas. Dia e noite passageiros
chegam e partem, famílias aguardam entes queridos ou se despedem de parentes,
grupinhos passeiam, casais se agarram e pessoas solitárias se sentam ou se
encostam no parapeito, e ficam ali, olhando para os outros e perdendo o olhar
no rio imenso. Durante o dia o sol queima a pele das pessoas e as cabeças dos moleques
fedem a matéria orgânica em combustão. Mas no fim da tarde sopra uma brisa que
refresca a cidade e no começo da noite o vento verga os caules dos açaizeiros e
agita os galhos das mangueiras, encapelando o estuário do maior rio do mundo. A
maré estava subindo e as embarcações dançavam como se fossem soçobrar, mas, bem
amarradas ao trapiche, eram mantidas prisioneiras, lembrando cavalos selvagens
recém-capturados. A água surrava a muralha da Fortaleza de São José de Macapá,
entrava por um canal e ia dar nas masmorras, onde os presos do Golpe de 64 conversavam”.
Outros trechos de A Casa Amarela citados por Fernando Canto: “A Fortaleza soltava-se, aos
poucos, na escuridão. À mediada que ia clareando, a fortificação mais se
parecia a um navio vagando no inferno”; “A Fortaleza São José de Macapá
erguia-se, imensa, na margem seca do rio. Sua existência, de pedras e de
sombras, em vez de tranquilizadora, pairava como uma ameaça. E quando o rio
avançava e havia vento, a maré chicoteava sua muralha de pedras, assentadas
pelos negros, que depois foram para o Curiaú, o Laguinho e os Congós”; “E
assim, sitiada pelo rio, a Fortaleza flutuava na água como um navio
fantasmagórico. À noite, as luzes da cidade eram testemunhas daquele vagar
infernal: uma Fortaleza flutuando no rio Amazonas, ventre inchado, estourando
de vermes e berros noturnos. Ali na Fortaleza de São José de Macapá nascia uma
nova civilização”.
Diz Fernando Canto sobre o meu trabalho: “O contista Ray
Cunha expressa com mais fidedignidade o discurso da contracultura em relação ao
tempo da Ditadura Militar. Suas obras são baseadas em casos verídicos, como as
prisões de amigos seus nesse período histórico de repressão no Brasil. Ele
transgride o discurso oficial e o dissimulado, o texto encomiástico e o
aparentemente contrário ao sistema. Dá a eles o trato de reprocessamento da
memória coletiva (assim como uma voz de tantos que queriam dizer o que ele
diz), quando recupera o passado a partir de uma relação entre o objeto e o
leitor, entre o indivíduo e grupo e entre estados temporais que evocam
principalmente o passado e o presente de sua construção literária. Ele narra o
fato comum aos olhos comuns do embarque e o desembarque de passageiros da
Amazônia, deixando nas entrelinhas aflorar gestos, cheiros e movimentos da
paisagem humana do território amazônico, tão comuns que nem sempre se percebe.
Trata a Fortaleza de São José de Macapá com metáforas regionais, “um navio no
inferno”, “um navio fantasmagórico”, uma fortaleza que flutua com o ventre
inchado, como se fosse um monstro, talvez uma esfinge que espera ser decifrada
no tempo”.
Há um quarto elemento da identidade amapaense, aliás, um elemento
comum na Amazônia: o complexo do colonizado. Os amazônidas saíram das mãos dos
portugueses e caíram nas mãos de governadores, prefeitos, senadores e deputados,
que, com raras exceções, os vêm explorando tanto quanto os colonos lusitanos, e
os colonizados dizem amém.
No caso do Amapá, trata-se de um dos estados mais subdesenvolvidos
do país, apesar de contar com um dos portos mais estratégicos do Brasil, o
Porto de Santana, com calado para cargueiros transatlânticos e o mais próximo dos
Estados Unidos, Europa e Ásia (via Canal do Panamá). Macapá está ligada por
rodovia à Caiene, a capital da Guiana Francesa, e conta com aeroporto
internacional.
Além disso, a costa do Amapá é um santuário de peixes e
frutos do mar, pois é banhada, simultaneamente, pelo Atlântico e o Amazonas,
além de outros gigantes de água doce. Recentemente, descobriu-se uma gigantesca
bacia de petróleo no Amapá, mas a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima,
Marina Silva, não quer nem ouvir falar em exploração de petróleo na Amazônia.
Marina Silva, apesar de ser acriana, mas mora em São Paulo, acha
que os amazônidas são quelônios, comem folhas. Deve ser isso que ela defenderá
na trigésima Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025
(COP30), em Belém do Pará, de 10 e 21 de novembro.
O ator Leonardo DiCaprio é outro que deve pensar que os
amazônicas são bichos de casco. Ele estará presente na COP30. Ativista
ambiental, irá a Belém para promover a “luta contra as mudanças climáticas”. Cientistas
sérios já afirmaram e reafirmaram que mudança climática é natural. É só
pesquisar para se chegar à conclusão de que esse negócio de mudança climática é
promovido por países que não querem que a Amazônia se desenvolva, para melhor
explorá-la. Promovem também a histeria dos militantes ecocomunistas.
Quanto ao Amapá, não conta sequer com energia elétrica
firme. Assim, como poderia suportar, por exemplo, estaleiros?
Quanto ao turismo, Macapá, à margem esquerda do Rio Amazonas e cortada pela Linha Imaginária do Equador, é, por si só, um apelo ao turismo, como entrada para o mundo amazônico, com sua culinária paraense. Mas a cidade sofre apagões, não conta com rede de esgoto e, às vezes, de suas torneiras, sai lama, ao invés de água, apesar de a cidade ser banhada pelo maior rio do mundo.
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