Palestras de Leão Zagury, Ray Cunha e Wilson Carvalho
RAY CUNHA
BRASÍLIA, 1 DE
SETEMBRO DE 2024 – Convidado para falar dia 20 de junho de 2023, no
auditório do Senac, na Avenida Henrique Galúcio 1999, Centro de Macapá/AP, em
comemoração aos 70 anos da Academia Amapaense de Letras (AAL), fundada em 21 de
junho de 1953, o gancho da minha palestra foi a sede própria do silogeu.
Afirmei, na minha fala, que a Academia é a maior responsável pela produção,
provisão e vigilância da cultura amapaense, ou seja, da identidade tucuju. Daí
que deve reivindicar sede própria aos políticos locais.
Contudo, adverti: aos políticos não pedimos, exigimos, e as
promessas devem ser amplamente divulgadas e cobradas, olho no olho. Soube, depois,
que as promessas são muitas, do governador ao deputado, e que já deram sinal
verde para os acadêmicos escolherem um prédio.
Sugiro aos acadêmicos se reunirem e procurarem conversar,
juntos, com o governador e com o prefeito, sempre com a imprensa ao lado, para
garantir um prédio ou um terreno no centro da cidade. Se for um terreno, podem
fazer negócio com uma construtora e incorporadora e garantir parte de um edifício
de vários andares, onde a Academia seria instalada e as demais salas, alugadas,
para custear o funcionamento e trabalhos da instituição.
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Ray Cunha defronte ao Palácio Austregésilo de Athayde, no centro do Rio |
Na palestra, dei como exemplo a criação da Academia
Brasileira de Letras (ABL), fundada em 20 de julho de 1897, nas instalações do
Pedagogium, prédio fronteiro ao Passeio Público, no centro do Rio de Janeiro,
pelos escritores Machado de Assis, Lúcio de Mendonça, Inglês de Sousa, Olavo
Bilac, Afonso Celso, Graça Aranha, Medeiros e Albuquerque, Joaquim Nabuco,
Teixeira de Melo, Visconde de Taunay e Ruy Barbosa.
Inspirada na Academia Francesa, é composta, atualmente, por
quarenta membros efetivos e perpétuos, 25 dos quais devem morar no Rio de
Janeiro, e 20 sócios correspondentes estrangeiros, com a missão de cultuar a
língua portuguesa e a cultura nacional, especialmente a literatura brasileira.
Sem sede própria nem dinheiro, as reuniões da ABL eram
realizadas nas dependências do antigo Ginásio Nacional, no Salão Nobre do
Ministério do Interior, no salão do Real Gabinete Português de Leitura e no
escritório de advocacia do primeiro secretário, Rodrigo Octávio, na Rua da
Quitanda 47.
A partir de 1904, as reuniões passaram a acontecer no
Silogeu Brasileiro, um prédio público que abrigava outras instituições
culturais, até 1923, quando o governo francês doou à academia o prédio do
Pavilhão Francês na Exposição do Centenário da Independência do Brasil, na Avenida
Presidente Wilson 203, uma réplica do Petit Trianon de Versalhes, projetado
pelo arquiteto Ange-Jacques Gabriel, entre 1762 e 1768.
Em 1923, o governo francês doou à ABL o prédio do Pavilhão Francês, tombado, em 9 de
novembro de 1987, pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (Inepac), da
Secretaria Municipal de Cultura do Rio de Janeiro.
Desde a década de 1950, os acadêmicos tinham planos de
demolir o Petit Trianon para erguer no terreno uma torre moderna, para o que
precisavam conseguir financiamento na Caixa Econômica Federal.
Pernambucano de Caruaru, Belarmino Maria Austregésilo
Augusto de Athayde nasceu em 25 de setembro de 1898 e faleceu em 13 de setembro
de 1993, no Rio de Janeiro. Graduado em Direito, trabalhava como jornalista.
Fez oposição à Revolução de 1930 e apoiou o Movimento Constitucionalista de São
Paulo, de 1932, o que o levou à prisão e ao exílio durante meses na Europa –
Portugal, Espanha, França, Grã-Bretanha e Irlanda do Norte – e Buenos Aires,
Argentina, onde morou por dois anos (1933-1934).
Retorna ao Brasil e reassume no grupo Diários Associados,
como articulista e diretor do Diário da
Noite e redator-chefe de O Jornal,
onde mantém a coluna diária Boletim
Internacional. Cai o Estado Novo e Austregésilo de Athayde faz pressão para
a abertura de inquérito policial e administrativo para apurar os crimes e
desvio de verbas públicas do regime deposto. Ao convite do magnata da imprensa
Assis Chateaubriand, torna-se CEO dos Diários Associados, então o maior
conglomerado de mídia da América Latina. Após a morte de Assis Chateaubriand,
em 1968, passa a integrar o condomínio proprietário dos Diários Associados.
Em 1948, integra a delegação brasileira na III Assembleia
Geral das Nações Unidas, em Paris, e a comissão redatora da Declaração
Universal dos Direitos do Homem. Em 1953, é diplomado na Escola Superior de
Guerra e passa a ser conferencista daquele centro.
Em 17 de maio de 1958, recebe a comenda da Ordem Militar de
Cristo; em 20 de dezembro de 1960, a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique;
e, em 26 de novembro de 1987, é agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Militar de
Sant'Iago da Espada de Portugal.
Autor de Direitos
Humanos no Século 21 (Austregésilo de Athayde e Daisaku Ikeda), Histórias Amargas (1921), A Influência Espiritual Americana
(1938), Mestres do Liberalismo
(1952), Vana verba (1966), Epístola aos Contemporâneos (1967), Conversas na Barbearia Sol (1971), Filosofia básica dos direitos humanos,
ensaio (1976), e Alfa do Centauro,
crônicas (1979), ingressa na Academia Brasileira de Letras, em 9 de agosto de
1951, para a cadeira 8, sucedendo a Oliveira Viana, e é recebido pelo acadêmico
Múcio Leão, em 14 de novembro daquele ano. Em 1958, torna-se presidente do
silogeu, o que exerce durante 34 anos, até sua morte, em 1993.
Austregésilo de Athayde era contra a demolição do Petit
Trianon e mudou o rumo da história. Pediu ao presidente Juscelino Kubitschek a
doação do Pavilhão Inglês, anexo ao Petit Trianon, na Avenida Presidente Wilson
com a Rua Santa Luzia e a Avenida Presidente Antônio Carlos, com o objetivo de demoli-lo
e construir em seu lugar uma moderna torre.
No último ano do seu mandato, 1960, Kubitscheck atende ao
pedido e assina o decreto de doação. Contudo, no ano seguinte, o novo
presidente da República, Jânio Quadros, revoga a doação feita pelo presidente
Bossa Nova.
A partir daí, Austregésilo de Athayde percorre um longo
caminho pelos corredores da Ditadura dos Generais (1964-1985), conversando e
trocando correspondência com militares graduados, como o coronel Jarbas
Passarinho e o general Lira Tavares. Em abril de 1967, o presidente Castelo
Branco assina o decreto de doação do Pavilhão Inglês, mas uma cláusula impedia
qualquer modificação no edifício.
Em agosto de 1969, o presidente Costa e Silva adoece e
assume o comando do país uma junta militar, liderada por Lira Tavares. Morre o
acadêmico Múcio Leão. Em 30 de dezembro daquele ano, Lira Tavares se candidata
à vaga de Múcio Leão e vence o poeta alagoano Lêdo Ivo. Em 2 de junho de
1970, Lira Tavares toma posse na ABL.
Em setembro de 1970, o presidente Garrastazu Médici derruba
o impedimento de demolição do Pavilhão Inglês, resolução aprovada pelo Congresso
Nacional em 3 de dezembro daquele ano.
Em 1974, Austregésilo de Athayde se encontra com o
presidente Ernest Geisel, que lhe dá sinal verde para pedir um empréstimo na
Caixa Econômica Federal. O empréstimo sai em 15 de maio do ano seguinte. Em 16
de junho, falecia o acadêmico Ivan Lins. O ex-presidente Juscelino Kubitscheck
se candidata à vaga, mas os militares não queriam Juscelino na academia. Outro
candidato era o escritor baiano Bernardo Élis, que, assim como Juscelino, fora
punido pela Revolução de 1964. Mas o que os militares não queriam na academia
era Juscelino, que perdeu para Bernardo Élis.
Em 1975, começam as obras do Edifício Centro Cultural do
Brasil, o Palácio Austregésilo de Athayde, projetado pelo arquiteto carioca Maurício
Roberto Doria Baptista (1921-1996), formado pela Escola Nacional de Belas Artes
(1939-1944). Construído pela Ecisa Engenharia e inaugurado em 1979, o Palácio
Austregésilo de Athayde é uma torre de 115 metros, 30 andares, 12 elevadores
sociais, ar-condicionado central, 112 vagas de estacionamento, garagem com
manobrista, salas de auditório com capacidade de 12 a 288 pessoas e brigada de
incêndio 24 horas. A ABL ocupa somente algumas das dependências do edifício,
que é sede de empresas nacionais e multinacionais.
Parte do Palácio Austregésilo de Athayde é utilizada para as
atividades culturais da ABL e parte é alugada para várias empresas. É daí que
vem a renda da academia.
A Biblioteca Acadêmica Lúcio de Mendonça fica no
segundo andar do Petit Trianon, ocupando uma área de 250 metros quadrados. Além de livros, seu acervo se constitui também de quadros de
grandes pintores, esculturas e móveis de época. Remonta à criação da Academia
Brasileira de Letras, com a doação do romance Flor de Sangue, pelo seu autor, Valentim Magalhães, em 28 de
dezembro de 1896, mas foi criada em 13 de novembro de 1905, proposta por
Rodrigo Octavio, seu primeiro diretor, ainda sob a presidência de Machado de
Assis.
Desde sua fundação, a academia recebe doações de coleções
particulares de acadêmicos, escritores, intelectuais e bibliófilos, como do
próprio Machado de Assis e escritores como Manuel Bandeira e Olavo Bilac.
Seu acervo conta com primeiras edições de obras clássicas da literatura
mundial, assim como obras raras, destacando-se a edição de Os Lusíadas, de Luís de Camões, de 1572.
Em 1999, com 20 mil volumes, não havia mais espaço para
ampliar o acervo, assim, por sugestão do acadêmico Josué Montello, na
presidência do acadêmico Arnaldo Niskier, foi criada a Biblioteca Rodolfo
Garcia, no Palácio Austregésilo de Athayde, visando o público em geral,
enquanto a Biblioteca Acadêmico Lúcio de Mendonça atende aos acadêmicos e
pesquisadores.
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Ray Cunha autografa o romance JAMBU, nos 70 anos da AAL |
Em 5 de abril deste 2024, fui eleito o primeiro sócio correspondente
da Academia Amapaense de Letras, por unanimidade, conforme comunicado do
secretário da AAL, Paulo Tarso Barros, confirmado pelo presidente do silogeu,
Fernando Canto, pessoalmente, durante encontro, dois dias depois, no Aeroporto
Juscelino Kubitschek, em Brasília/DF, onde o escritor fez escala rumo a São
Paulo.
Meu patrono na AAL é o poeta Isnard Brandão Lima Filho, que
considero o pai da minha geração de escritores.