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| Melhor falar de poemas. O azul sangra porque é cobalto e se move |
RAY CUNHA
BRASÍLIA, 7 DE
OUTUBRO DE 2025 – Estou só na Cafeteria Kopenhagen, no Shopping Conjunto
Nacional. É de tarde. Bebo um espresso curto. Sei que não deveria tomar café à
tarde, pois não consigo dormir, à noite, mas estou só, com a minha velhice. Já
estive aqui, nesta cafeteria, desde 1987, batendo papo com amigos, mas os
amigos se foram. Gosto da minha própria companhia. Bastam-me as portas da minha
estante, que me levam para toda parte, mas, às vezes, sinto falta de Fernando
Canto. Ele era minha única ponte, em Macapá/AP, minha cidade natal. Macapá é,
agora, está tomado por comunistas.
O shopping continua o mesmo. Mulheres tão lindas que parecem
saídas de O Grande Gatsby passam
pelos corredores. Em algum lugar, uma mulher ri alto, um riso cristalino, que,
de alguma forma, me lembra, imediatamente, pizzicato. De repente, ouço um
grito. Em uma das prisões onde Alexandre de Moraes enterra os presos políticos
uma mulher apanha na cara. É uma senhora, uma senhora idosa, avó, presa porque
estava na Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023.
Já não consigo mais imaginar o azul cobalto rasgado por um
caça, vertendo sangue, de tão vivo. Verte sangue da barriga de Bolsonaro.
Sangue da cor de batom. Batom é preciso, viver não é preciso. Haverá maior
símbolo de liberdade do que batom vermelho escrito na Justiça? É como
desvendar-lhe os olhos do espírito e libertar o mundo de toda maldade. Condenada
a não veres teus filhos crescerem, agora, és heroína, Débora, e nem Xandão, ninguém
te deterá no interminável espaço. Nada cessará a luz que disseminas no éter. Batom
é como pétalas de rosas rubras, que nascem nos jardins até o fim do Universo, que
Deus disseminou como perfume azul. Batom, mesmo que escrito no duro granito, como
pode ameaçar o Estado de direito, se batom é preciso, viver não é preciso?
O Supremo Tribunal Federal (STF) condenou Débora Rodrigues
dos Santos a 14 anos de cadeia e 30 milhões de reais em multa porque no dia 8
de janeiro de 2023 Débora escreveu na estátua A Justiça, de Alfredo Ceschiatti, defronte ao palácio do STF,
“perdeu, mané”. Ela é jovem, casada, e tem duas crianças. Foi assassinada por
causa de um batom vermelho.
Haverá algo mais bonito do que os lábios de uma mulher? Sim,
os lábios pintados de vermelho, como rosa colombiana. Lábios pintados de
vermelhos transmitem a sensação da luz triunfando. De liberdade.
Segundo o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, eviscerado
com uma peixeira que por pouco não o transfixa, o golpe de Estado de 8 de
janeiro de 2023 é uma narrativa tão esdrúxula que nem os mais delirantes
roteiristas de Hollywood conseguiriam criar. Bolsonaro é acusado de comandar o
golpe e foi preso. De acordo com seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro
(PL/SP), Bolsonaro morrerá à mingua, na prisão.
O café tem gosto de sangue. Mas, para minha salvação, a
própria tarde ainda é azul. E sinto a velha sensação de que a tarde é como um
navio, lento, no horizonte, misterioso. Então, procuro pensar que a bordo haja
cafuzas de olhos verdes, negras das Guianas e ucranianas ruivas.
José Aparecido Ribeiro me serviu a cerveja. Não lembro mais
da marca, mas a garrafa estava enevoada e a bebida me soube a romance, a uma
aventura, há muito tempo atrás, agora fiquei confuso, não me lembro mais se foi
em Belém ou Manaus.
Sinto a presença de Fernando Canto, e também de Isnard
Brandão Lima Filho. Chegam ainda Ernest Hemingway, Gabriel García Márquez e Juan
Rulfo. Ouvimos Patricia, de Dámaso
Pérez Prado. Percebo a presença de Olivar Cunha, que chega com uma garrafa de
rum Bacardi. Não estamos mais na Kopenhagen, mas no Gato Azul, em Macapá.
Chegam mais Alcy Araújo, R. Peixe e Alcinéa Cavalcante.
Não falamos sobre política. Os gemidos de Bolsonaro foram
sufocados pelo som de conversas, tilintar de copos, garrafas sendo abertas,
coqueteleiras chacoalhadas e mambo.
A noite reina lá fora. Ninguém pode tirar sua soberania.
Soberania é como a lei da gravidade. Como a Lei Magnitsky. Há dois sujeitos com
quem eu gostaria de bater papo. É claro, em uma língua que ambos dominássemos.
Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, e Elon Musk. Tenho a impressão de
que são sábios.
Vi Lula da Silva uma vez apenas. Foi na campanha para a Presidência
da República, em 2002. O país todo estava apaixonado por ele. A TV Globo dava a
entender que ele era o estadista que poria o Brasil lado a lado com os Estados
Unidos. Eu estava cobrindo, como jornalista, uma aparição dele no Centro de Convenções
do Brasil 21, no Setor Hoteleiro Sul, em Brasília. Uma multidão urrava,
tentando se aproximar dele, tentando pegar na roupa dele, nos pés dele. Lula me
deu a impressão de que não estava entendendo nada, e consegui ver, através dele,
que ele era um anão, um réptil, uma pulga, uma tuxina, uma ameba, um vírus,
covid-19. Deu no que deu.
Agora, a Associação de Jornalistas Independentes e Afiliados
(Ajoia) está se organizando, juntando forças, da Direita, para mostrar o que é
soberania. A Ajoia é sediada em Belo Horizonte. Os mineiros não estão amoitados.
Na Associação Brasileira dos Jornalistas de Turismo, Seccional
do Distrito Federal (Abrajet/DF), sinto uma preocupação com o que dizem de
Brasília por aí, que em Brasília rouba-se muito etc. É por causa do Congresso
Nacional, um valhacouto de bandoleiros. Tenho um amigo que acha que o problema
do Brasil é porque o Congresso Nacional é perigoso. É! Mas é o reflexo dos
eleitores brasileiros.
Lula da Silva já fodeu com o país e torce para que Trump
faça com o Brasil igual os Estados Unidos fizeram com Cuba, pois assim ele
poderá instalar sua ditadura tranquilamente, só que Trump tem outros planos,
pois o Brasil não é Cuba. Nicolás Maduro, o câncer da Venezuela, já está no
porrete de Trump. Ele pegará Lula de outro jeito. Magnitskamente. E depois pela
Rua Faria Lima.
Parei de beber a algum tempo, mas as cervejas que o
Aparecido bebe são tão enevoadas e saborosas quanto Cerpinha, ou Antarctica, Original.
Fui perseguido por um assassino. Dei um jeito nele. Ao chegar ao hotel, a princesa
estava me esperando. Bebemos Dom Pérignon, apreciando a noite, do sétimo andar.
Não quero mais me lembrar, hoje, do Bolsonaro eviscerado,
ouvir seus soluços. Nem quero mais ouvir os gritos de avós levando bofetões na
cara. Nem de me lembrar dos presos políticos mortos e inocentes. Quando o preso
é culpado, ele grita na cadeira elétrica, mas sabe que é culpado. O preso que
está morrendo, inocente, deve morrer como boi, ou frango, sente que vai morrer
e sente medo, terror. Bolsonaro não sente terror, porque heróis sabem a que
vieram. Prefiro falar de poesia. De Roberto Carlos. DE TÃO AZUL SANGRA

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