quarta-feira, 29 de outubro de 2025

O clube dos onipotentes

Ponte JK, DF (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)

RAY CUNHA

De vez em quando vou ao Congresso Nacional para fazer algum freelance. Até certo tempo atrás, passava boa parte do dia, lá, cobrindo as atividades para jornal ou portal, ou assessorando parlamentares. Para um escritor, o Congresso é um laboratório, pois abriga uma fauna riquíssima em tipos, capaz de satisfazer os mais criativos ficcionistas. Foi assim que conheci um senador inesquecível, que evoca aquele fedor de ácido úrico que, às vezes, sentimos nas paradas de ônibus. 

Era o tipo que carrega consigo, sempre, uma saca de confete. Seu corpanzil esparramado na poltrona atrás da sua mesa de trabalho lembrava um animal híbrido, com cabeça de ratazana e, do pescoço aos pequenos pés, um yorkshire. Quem o via, mesmo uma única vez, jamais o esquecia, muito menos quem convivia com ele; aí, se tornavam puxa-sacos, embora cultivassem contra ele o sentimento que oscila da bajulação ao ódio, movidos pelo interesse, pois só assim era possível conviver com ele, já que seria impossível sentir amor por uma criatura tão mesquinha e odiosa. 

Nesses casos, o interesse transforma os interessados em diplomatas, sempre com um facão mental pronto para o golpe, com a peixeira entrando pela saboneteira e mergulhando até o coração. Mas, para não exaurir a fonte de corrupção, vão golpeando aos pouquinhos o objeto do seu ódio contido, procurando tirar alguma espécie de proveito, alimentando a esperança de vê-lo exangue, pilhado, morto. Um jogo no esgoto. 

O senador era quase uma unanimidade, incensado pela imprensa setorizada no Congresso Nacional. Os que transcendiam o olhar de mero jornalista logo percebiam o jogo. Se os gabinetes dos senadores do baixo clero são conjuntos principescos de salas, os gabinetes dos incensados pela mídia são mais impressionantes ainda, caso do senador em questão. Seu gabinete estava sempre de portas abertas para jornalistas, à disposição para a prestação dos mais variados serviços, de xeroxes a telefonemas internacionais e passagens aéreas, até presentes em dinheiro, o que alguns repórteres adoravam, e se entregavam ao jogo com o mesmo brilho nos olhos dos glutões nos banquetes. 

Falar em glutão, essa era outra das características do senador que o tornavam tão inesquecível, e ultrajante. Ele praticamente não mastigava. Comia no almoço, facilmente, um quilo de boia, que ia se acamar numa pança roliça, um tonel, rijo de tão inflado, o intestino grosso transformado em uma fossa, com, seguramente, meia centena de quilos de dejetos presos nas dobras da tripa, somados aos 100 quilos de peso do paquiderme, muitos dos quais armazenados na barriga, fígado, quadris e coxas. 

Outro fator impressionante era sua história, real ou imaginária, que ele contava para a plateia amestrada. Afirmava que herdara do seu pai, desempregado crônico, sua prodigiosa energia sexual e instrumento asinino, e, da mãe, dona de um mercadinho, o tino para os negócios. O fato é que desenvolveu o desprezo com que tratava as mulheres observando como seu pai se comportava com sua mãe; ela passava o dia trabalhando e era trabalhada, assim que se deitava, por um macho bem-disposto. Ela costumava dormir quase que imediatamente, embora mantivesse a consciência de que era penetrada ardência no dia seguinte. 

– Meus caros, diletos amigos, chegou a hora de nos assenhorearmos deste fabuloso país, chegou a hora de ocuparmos nosso bunker, o bunker da elite do sistema, que somos nós. Precisamos terminar de construir nossa Havana, cercando a Praça dos Três Poderes com uma verdadeira Muralha da China. Precisamos, juntamente com Lula no Palácio do Planalto, instalar logo a ditadura totalitária e se espojar em uma bacanal jamais sonhada, tudo com dinheiro do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, e da burra, é claro – ele disse, segundo me foi descrito pelo seu segurança, que era gente minha. 

Ele continuou: 

– Tudo será pago: os estacionamentos públicos, a manutenção dos cemitérios, o setor de saúde, a segurança, a exploração de água, esgoto e luz, alimentos a materiais em geral utilizados no setor público, principalmente nas escolas e hospitais, e partilharemos as terras devolutas – o animal híbrido fez uma pausa e olhou para a plateia. Tinha consciência de que a fala de radialista era sua melhor ferramenta; mastigava as palavras, burilava-as, tornava-as uma mentira convincente para ele mesmo. Treinara a exaustão o falar com fluência, flexionando os verbos e os pronomes corretamente. 

À mesa, à frente e à direita do senador, estava o bilionário mineiro Boca Mole, que parecia beber as palavras sopradas pelo paquiderme. Boca segurava impecável lenço de linho branco para limpar a baba que teimava em escapulir entre os lábios frouxos; às vezes, lambia os beiços arroxeados com uma língua de boi. Comentava-se que tinha uma ferramenta tão poderosa quanto a língua, e que era mais perigoso, nesse quesito, do que o senador, pois não deixava escapar nem o diabo de saia. 

Fizera fortuna durante a construção de Brasília, afinal, sempre estivera certo de que o DF estava destinado aos mineiros; não fora um mineiro que demarcara o Distrito Federal e construíra Brasília? E não se tirou sequer um naco de Minas Gerais; o DF foi arrancado, ou melhor, implantado, em Goiás. O senador seria apenas mais uma catapulta para seus negócios, rumo a se tornar o homem mais rico do país. Aquele porco catapultaria seus negócios de tal maneira que lhe dava a perspectiva de se tornar até o homem mais rico do mundo. 

À esquerda do senador, o rei do transporte público, goiano, fumava um Cohiba. Mandara fazer implante de cabelos e pintava-os, juntamente com os que lhe restavam, tão negros que resvalavam para um tom azulado. Os cabelos ralos e manchas escuras que lhe malhavam o rosto encovado lhe davam aspecto sinistro. Comentava-se que teria mandado matar o pé de pano que dava à mulher dele o que ele não podia mais proporcionar a uma potra meio século mais jovem. 

Entre os dois, flutuava a deputada, mineira, dona de uma das maiores empresas de segurança e limpeza do país. Lembrava Jéssica Rabbit; toda vez que Boca Mole olhava para ela a baba teimava em sair dos lábios em prolapso. Seguramente, um bom naco do país pertencia àquele quarteto. 

No outro lado do salão, perto da porta principal, o segurança e motorista do senador, homem de sua estrita confiança, estava sentado numa poltrona, imóvel como uma estátua, de óculos escuros e empacotado em um terno preto de nylon. Tinha cerca de 50 anos e lembrava todinho um búfalo com garras de leão. Estava ali, imóvel como uma estátua, mas era capaz de ouvir até sussurros e podia enxergar através das paredes, por meio do faro. Dizia-se descendente de Lampião e havia o boato de que estripara uma família inteira em Pernambuco, antes de migrar para Brasília, onde foi acolhido pelo senador. 

Chegou a Brasília no fim dos anos 1980, atraído pelo lote, pão, leite, hospital e escola que o governador Joaquim Roriz estava oferecendo para migrantes de todo o Brasil, que formariam seu curral eleitoral ao transformar o Distrito Federal em Estado. Na época, o senador ainda não era senador; tinha um devezenquandário. Quando viu Lampião reconheceu de imediato que aquele gigante tinha potencial para se tornar seu segurança e motorista, e, se precisasse, matador. 

Acolheu o búfalo, que viera com mulher e um casal de crianças, e providenciou-lhe aula de volante e um curso especial em uma empresa de segurança, onde Lampião se aprimorou zelosamente em artes marciais e armas brancas – principalmente katana, pois um de seus instrutores era mestre em espada japonesa –, e de fogo, além do curso de Direito no Centro Universitário de Brasília (Ceub). 

Nessa época, o sócio do futuro senador no devezenquandário sacou o que estava acontecendo e publicou uma matéria profética sobre o inchaço que Brasília viria a sofrer. Foi um tiro no pé; ou melhor, no timo, o que se tornou a marca registrada de Lampião. 

– Para isso, meus irmãos, para que tomemos conta deste país, para que este país seja completamente nosso, para que possamos fazer o que quisermos no nosso país, para que nos tornemos intocáveis no nosso país, precisamos tomar posse, de fato, dele; e eu sou o homem que vai nos proporcionar essa chegada total ao poder. 

Fez uma pausa, e continuou. 

– Mas, para que nos tornemos – fez outra pausa –, para que nos tornemos onipotentes, sim, onipotentes, precisamos acabar com ele, vocês sabem quem, e fortalecer o nosso grande comandante. Para isso, senhores, precisamos depositar, cada um de nós, um milhão de reais na conta do nosso clube, dinheiro que será usado, desde agora, para derrubar... vocês sabem quem, para extirpar da Humanidade a ameaça que paira na Esplanada dos Ministérios, e que deveria ter sido arrastado para o inferno, mas que sobreviveu graças à incompetência de terceiros. 

Fez de novo uma pausa. 

– Também precisamos, desde agora, planejar a campanha vitoriosa e eleger nosso líder, além de mim, e o máximo de deputados e senadores. Aqui está o número da conta em que deverão depositar o dinheiro – o senador passou um papel com as anotações para cada um deles. E voltou a falar. 

– É claro que, assim como nós, há, no Brasil inteiro, alguns líderes, homens de bem, trabalhando para recolocarmos nosso grande chefão de volta de onde ele nunca deveria ter saído; o trabalho principal ficará a cargo da quase uma dúzia de aves de rapina que pousam na Praça dos Três Poderes. Nessas alturas dos acontecimentos, o palhaço não será eliminado fisicamente, mas desmoralizado e, mais para a frente, apodrecerá na prisão. Morrerá pelo desgaste, e levará consigo seus filhotes para o inferno. 

Silêncio. 

– E as forças...? Você sabe... – Jessica Rabbit perguntou. 

– Desde 1985 que não querem se meter na vida política do país – o senador respondeu, e, baixando a voz. – Não podemos perder a oportunidade de aumentar nossa força de pressão; temos que devolver o Palácio ao molusco, de onde ele nunca deveria ter saído. Por isso, precisamos ser generosos, porque temos que tomar conta do Congresso Nacional e de aparelhar todos os poderes do nosso querido Brasil. Para isso, será necessário muito dinheiro, desde agora. Mas esse dinheiro será multiplicado e restituído. Porém o melhor de tudo, meus amigos, meus sócios, membros diletos deste clube exclusivíssimo, é que nós é que faremos e aplicaremos a lei, e perpetuaremos isso, indefinidamente, por meio dos nossos descendentes, como em uma dinastia. 

Seguiram-se uns seis segundos de silêncio, rompido por aplausos entusiasmados. 

– Criaremos a Bolsa Futuro, de um terço do salário-mínimo, para meu curral eleitoral. Não esqueçamos a esperteza de Roriz, que criou, e cultivou, durante seu reinado, um curral eleitoral fiel, dando lote, pão, leite e restaurante boca-livre; criou o Legislativo e se perpetuou governador por duas décadas. E não esqueçamos da Bolsa Família e do aparelhamento do Estado. O Brasil é rico, muito, muito rico, e homens, e mulheres, como nós, de visão, precisamos tomar conta desta imensa riqueza. 

Mais aplausos, tão entusiasmados que fez Maurício Virgulino da Silva olhar, rapidamente, para os homens e a mulher reunidos em torno da imponente mesa. 

O senador havia se levantado para pegar uma garrafa de licor de jenipapo, maturado em cachaça Havana, ou Anísio Santiago. Jessica Rabbit mexera-se, expondo ainda mais o colo e as coxas, o que fez Boca Mole se engasgar. Do outro lado, o czar goiano parecia fazer contas mentalmente; era quase audível o tilintar que saía da sua boca trancada, quase um bico. Sonhava com o futuro, uma Mônaco no Planalto, com cassinos cheios de magníficas goianas e mineiras de biquini servindo champagne e licores mineiros e do Cerrado. 

– Governador, pode contar comigo. Hoje mesmo vou transferir um milhão de reais para a conta – disse Jéssica Rabbit, com voz dengosa, sonhando em ampliar sua fatia de segurança privada e a recolha de lixo em todo o país. Comentava-se que ela matara pessoalmente o velhinho milionário de quem cuidou como enfermeira e depois como esposa, e de quem herdou uma fábula, a qual multiplicou após se tornar deputada. 

O murídeo-suíno riu. Rindo, a cara de rato se transformava em um focinho de hiena. 

Boca Mole lambeu os beiços. 

– Assim como nossa estimada, nossa querida colega, nossa Jéssica Rabbit, vou também depositar, hoje mesmo, um milhão de reais na conta. E pode contar comigo para o que der e vier – disse Boca, lambendo os beiços novamente. 

Jéssica Rabbit se mexeu na cadeira e lançou o olhar dengoso para Boca. Dessa vez a baba escorreu, mas Boca limpou-a logo. 

O escaveirado czar goiano disse, embora com dificuldade, que também disporia de um milhão de reais. 

– E o projeto de lei em tramitação no Congresso legalizando o jogo de azar tem chance de ser aprovado? – perguntou. 

– Está tramitando, mas no momento todo mundo no Congresso está unido para darmos fim ao Messias – disse o senador, degustando as palavras. – Acho que assim que dermos cabo dele voltaremos a mexer com o projeto de lei da jogatina. 

– Já pensaram Brasília transformada numa Mônaco, numa Las Vegas do Hemisfério Sul, e nós controlando tudo? Não vai ter banco que suporte guardar toda a grana que ganharmos! – o czar exclamou, entusiasmado. 

Jéssica Rabbit olhou cobiçosa para o zumbi. 

– Ah! Eu sonho com isso! Sonho com a segurança dos cassinos! Vou mandar uma equipe inteira para Las Vegas para aprender como se faz segurança de cassino! – disse Rabbit, também entusiasmada, fazendo caras e bocas e se mexendo como uma cobra; Boca Mole não perdia nada. 

– E eu vou comandar a construção do trem-bala Brasília-Goiânia; vamos fazer desse polo Brasília-Goiânia o mais sensacional do país! – exclamou o czar. Estava tão emocionado que viram um pouquinho de rubor no seu rosto amarelo e encarquilhado. – E também tem uma coisa muito importante, que é o asfaltamento da cidade. Comecei a produzir um asfalto de primeira categoria em Goiás – ouvia-se o tilintar de moeda sempre que ele falava. 

– E será uma Las Vegas com cultura – interrompeu-o Boca Mole. – Vamos restaurar o Teatro Nacional e trazer para cá as maiores celebridades do mundo, e também vou ganhar a licitação para recuperar o Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Quero ainda o estádio Mané Garrincha para promover os maiores jogos do mundo, principalmente quando a jogatina estiver a todo gás. 

– Vou facilitar tudo; é claro que teremos uma taxa... – disse o senador. 

– É claro! Vamos fazer do Brasil o maior rendez vous do planeta – disse Boca Mole, dando uma gargalhada que contagiou os outros três, e até Lampião, que havia escutado as palavras de Boca Mole; sua boca era mole, mas o tom de voz, alto. 

Jessica Rabbit ficou sonhadora. Imaginava-se em uma Brasília ainda mais fantasiosa do que já é. Descruzou e cruzou as pernas e Boca Mole engasgou-se, com a impressão de ter visto a liga das meias dela. Fizera tudo o que julgava possível para obter os favores de Rabbit, e ela, pelo que lhe chegava aos ouvidos, esfregava-se até nas paredes, mas o evitava. Seria por sua boca mole? Ora, mas a boca mole era o resultado de trabalhar tão bem com a língua de boi; isso, de certa forma, acabou desencadeando aquela produção desenfreada de saliva. 

O senador serviu mais uma rodada de licor de jenipapo. Ele mesmo preparava a bebida. Gostava também de cozinhar, e era bom de cozinha. Vendo o alegre grupo, o senador sonhava: “Afinal, Lula não se tornou presidente? Como eu não poderia sucedê-lo? Ora, sou mestre em Política Internacional! Só terei que conquistar o eleitorado de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Região Sul. O Nordeste será fácil, e a Amazônia é canja! E já sei como vou ganhar São Paulo: é só prometer aos paulistanos que a cidade deles não irá mais para o fundo, no verão, e, aos capiaus do interior, bolsas-família, escola, universidade e até bolsa-puteiro, se for preciso; aos capiaus mineiros basta prometer bolsa-queijo; aos cariocas, e fluminenses, prometerei bolsa-feijoada e bolsa-samba (sorriu), e aos caipiras do Sul, bolsa-linguiça, charque, chimarrão, carne, chucrute, e tudo o que é porcaria da Europa”. 

– Governador! – disse Jéssica Rabbit, acordando o yorkshire. – Quero aproveitar para lhe pedir, usando sua influência, que refresquem lá no meu hotel. As meninas não estão podendo trabalhar direito; afinal, elas atendem senadores e deputados. 

– Pode deixar, minha filha! O meu hotel, o do Setor Hoteleiro Sul, também está sofrendo esse ataque. 

Jessica Rabbit se mexeu na cadeira de tal maneira que Boca Mole melou a cueca. Não resistiu e pôs sua mão sobre a mão de Jéssica. 

– Você está certa, princesa, não estão deixando a gente trabalhar; parece que mobilizaram toda a fiscalização em cima de mim também – disse Boca. 

– Tive que aumentar, substancialmente, a propina destinada a vários setores da administração pública da área federal – Zumbi se meteu na conversa. Referia-se ao jogo de azar que explorava principalmente em Goiânia. 

Jéssica deixou a mão de Boca Mole sobre a dela; com a outra mão, o asno limpou um ponto de baba no canto da boca. A deputada distrital mexeu-se, virando-se para um e para outro, exibindo parte generosa do colo. Boca Mole tirou a mão de sobre a dela, arrumou-se melhor na poltrona, passou o lenço nos beiços e guardou-o. Se não soubesse o que é autodisciplina não seria um dos homens mais ricos do país, e, depois, poderia ter quem ele quisesse; podia pagar por qualquer um; afinal, todo mundo tem um preço. Apesar de que Jéssica Rabbit tirava-o do prumo. Misturem Brigitte Bardot e Marilyn Monroe e terão Jéssica Rabbit, na cabeça do bilionário; melhor ainda, era a própria Jéssica Rabbit, a do desenho. 

O telefone celular do senador começou a vibrar. Ele pediu que continuassem à vontade enquanto atendia à chamada, explicando que aguardava por ela. Atendeu-a indo até uma poltrona no amplo salão, ricamente decorado. Conversou durante uns dois minutos e retornou à mesa. 

– Mais uma rodada de licor de jenipapo? – perguntou. Os três olharam-se. Eram 13 horas em ponto. 

– Eu já estou é com fome – disse Boca Mole, com água na boca. 

– Por que não almoçamos aqui? – Patarrão convidou. 

– Estão me esperando em casa – disse Boca Mole. 

– Preciso almoçar em casa também – disse Jéssica Rabitt. 

Zumbi pareceu avaliar um pouco. Não perdia uma boca livre. 

– Não! Eu, realmente, preciso ir! – disse, quase em um lamento. 

– Então está tudo certo! Estamos entendidos! – disse o senador. 

– Sim! Hoje à tarde o dinheiro estará na conta que você me deu! – disse Boca Mole. 

– É, hoje à tarde todos nós vamos fazer a transferência! – disse Jéssica Rabbit, levantando-se. Realmente, era de parar o trânsito. 

Todos se levantaram, inclusive Lampião, e Patarrão conduziu os visitantes até a porta. 

Quando saíam, Jessica atrasou-se e puxou o senador de lado. 

– Descobri um mimo para você que vai deixar você babando – cochichou no ouvido do porco. – Você terá a vitela mais linda que existe para realizar seus sonhos mais ousados. 

O senador salivou. 

Sozinho, agora, ligou para a pessoa com quem havia falado instantes atrás. Era sua mulher, que lhe fazia marcação cerrada; tornara-se paranoica e Jéssica Rabbit era seu maior pesadelo. Desenvolvera olfato quase canino e cheirava as roupas do seu fogoso marido, principalmente a cueca, em busca de indícios que pudessem justificar sua paranoia, mas era ela a investigada, pois o senador procurava se antecipar a cada passo da sua esposa, criando, para isso, um verdadeiro departamento de inteligência dentro da sua própria casa. Ouviu a voz. Uma sombra de desgosto perpassou-lhe o focinho. A megera, como ele a chamava mentalmente, era seu alicerce e terror. Herdeira de uma das maiores fortunas do país, conheceram-se quando ela começou a tomar aulas de voo com o porco, que era o instrutor; não demorou para que começassem a transar a bordo do monomotor. Casaram-se e ela começou a bancar o futuro senador, de quem se tornara acionista majoritária em quase todos os investimentos do marido. Engordara muito depois que casou e isso a tornou ainda mais alarmada. 

O senador entrou no seu carrão às 13h15. Minutos depois, cruzava o Lago pela Ponte JK, na límpida tarde brasiliense.

Rio de Janeiro, Meca do banditismo. Segundo Lula, narcotraficantes são vítimas da sociedade

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 29 DE OUTUBRO DE 2025 – O Rio de Janeiro, a Cidade Maravilhosa, é um barril de pólvora, a Meca do banditismo, um três por quatro do Brasil. Em 2023, foram registrados 45.747 assassinatos no país, dos quais 4.292 homicídios só no Rio de Janeiro. Nesta estatística, entra até turistas estrangeiros, mortos à facada na rua. Em 2025, o Rio recebeu cerca de 2 milhões de turistas internacionais e em torno de 13 milhões de brasileiros. É uma cidade tão bonita, tropical e atlântica – pessoalmente, acho-a a mais bela do planeta – que os turistas continuam querendo conhecer o Rio. 

Os bandidos também adoram o Rio. Chefões de todas as facções, ou máfias, do Brasil, não querem outra vida, bem como mafiosos de outros países. De modo que se o presidente americano Donald Trump quiser realmente salvar os Estados Unidos da droga vai ter que fazer alguma coisa com relação ao Rio, um entreposto gigantesco do narcotráfico e de todo tipo de crime que se possa imaginar. 

O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, do PL do ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, líder da Direita, já pediu ajuda do presidente Lula da Silva (PT), líder da Esquerda, para uma megaoperação nos redutos das facções, inutilmente. Cansado de esperar, deflagrou uma megaoperação, terça-feira 28. A polícia fluminense, 2.500 policiais civis e militares, com a participação do Ministério Público, conseguiu enviar para o astral mais de 100 bandidos e prender 81. A ação queria pegar pelo menos 100 mafiosos do Comando Vermelho nas favelas da Penha e do Alemão, na Zona Norte do Rio. 

O Ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, comentou que não recebeu nenhum pedido de Cláudio Castro para o envio de reforços federais durante a megaoperação. Cláudio Castro disse que fez sucessivos pedidos para as Forças Armadas cederem equipamentos para realizar as operações nas comunidades, mas que todos eles foram negados. 

– Não foram pedidas, desta vez (as Forças Armadas), porque já tivemos três negativas, então já entendemos a política de não ceder. Falaram que tem que ter GLO (Operação de Garantia da Lei e da Ordem), que tem que ter isso, que tem que ter aquilo, que podiam emprestar o blindado e que depois não podia mais emprestar porque o servidor que opera o blindado é um servidor federal, então tinha que ter GLO, e o presidente já falou que é contra GLO – disse Castro. – O Rio de Janeiro está sozinho nesta guerra. 

Castro viu que se ficar esperando por Brasília, o Rio de Janeiro vai explodir de vez, ou melhor, será entregue, todo ele, aos chefões do narcotráfico. 

– A gente entendeu que a realidade é esta, e a gente não vai ficar chorando pelos cantos. O Estado, ao invés de ficar transformando em uma batalha política, tá fazendo a sua parte e tá excedendo inclusive os seus limites e até excedendo as nossas competências. Mas continuaremos excedendo elas. Se precisar exceder mais ainda, excederemos na nossa missão de servir e proteger o nosso povo – sinalizou. 

Lula insiste em dizer que o Brasil é soberano, mas está parecendo que soberano é o narcotráfico. Sem respostas como a do Rio de Janeiro, as facções tomarão conta de toda a República Soberana, do Oiapoque ao Chuí, com capital no Rio de Janeiro. 

 – Isto aqui não é briga política, é um clamor por ajuda. As forças de segurança do Rio de Janeiro estão sozinhas. E é uma tristeza, e, curioso que a gente passou cinco anos com uma liminar proibindo helicóptero com plataforma de tiro e hoje a gente vê um drone com plataforma de bomba, e ainda não vi nenhuma ONG dessas que defendiam o fim do helicóptero criticar, agora, nem o PSB ter enviado nenhuma nota, que foi quem pediu o fim do uso de helicóptero, se solidarizando aos policiais e nem criticando esse tipo de arma – disse Castro, referindo-se ao fato de que tanto o governo Lula quanto o Supremo Tribunal Federal (STF) empenham-se pelos direitos humanos mas dos meliantes. É comum chefes do tráfico serem liberados. 

Em abril deste ano, o STF homologou o uso de câmeras em fardas e viaturas, e a comunicação imediata ao Ministério Público em caso de mortes decorrentes de intervenção policial. Ou seja, burocratizou ações policiais. Não demora e a polícia começará a comprar estoque de rosas para reuniões diplomáticas com as feras do narcotráfico. 

Há bairro no Rio onde a polícia não mete a cara. Chefões do narcotráfico fecham escolas, obrigam moradores a se tornarem distribuidores de droga, estupram qualquer mulher, principalmente adolescentes, e matam como se mata insetos. Aproveitando a situação, bandidos menores aproveitam para aterrorizar as ruas e fazem do conselho de Lula sua bússola: roubar celular para tomar cerveja, ou o drogado é culpado pelo tráfico de drogas, daí que não se deve mexer com os narcotraficantes, que, segundo Lula, são apenas vítimas da sociedade. As verdadeiras vítimas que se fodam!

domingo, 26 de outubro de 2025

Depois dos 70 anos, suave é a noite

A noite é um navio, um continente, uma galáxia. Só nossa!

RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 26 DE OUTUBRO DE 2025 – Este blogh é meu laboratório como escritor. Meus dois ou três leitores já perceberam, com certeza, que, às vezes, publico crônicas novamente, com modificações. Às vezes, junto duas crônicas já publicadas. Agora, pensei publicar um livro de crônicas e comecei a trabalhar seu texto final. Então, as crônicas precisam ser buriladas, para não envelhecerem. Arte só é arte se permanecer viva para sempre. Do contrário, será apenas jornalismo.

Certa noite de 1976, o poeta Jorge Tufic e eu bebíamos a inesquecível Antarctica manauara, enevoada, em taças, como era comum no bar Nathalia. 

– Lemos tudo o que precisamos ler na juventude. Depois disso, não lemos mais – disse-me o poeta, que tinha, então, 46 anos de idade. 

De certa forma, o poeta tinha razão. No meu caso, aprendi a ler aos 5 anos e nunca mais parei. Era tão viciado que durante certo tempo da minha vida lia até dicionário, bula de remédio e catálogo telefônico. Comecei lendo gibis e revistas ilustradas, do meu irmão mais velho, Paulo Cunha, e, pré-adolescente, passei para literatura pesada e livros técnicos, também do Paulo. Adolescente, já havia lido alguns clássicos, entre os quais Tender is the Night, Suave é a Noite, de um dos gigantes da literatura norte-americana, Francis Scott Fitzgerald. 

Quarto e último romance de Fitzgerald, lançado em 1934, Suave é a Noite é ambientado na Europa, especialmente na França, onde os americanos da geração perdida farreavam. Conta a história de Richard Diver, psiquiatra que comete o erro de se apaixonar por uma paciente, Nicole Warren. 

E é isso. As mais de 300 páginas do romance marcam o contraste entre a velha Europa e o modo de pensar e de viver dos norte-americanos da Geração Perdida do pós-Primeira Guerra Mundial. 

Para um garoto macapaense, no fim dos anos 1960, tudo aquilo era um mundo novo que se abria. Aliás, tudo para mim era novidade. Vivi em Macapá até os 17 anos e quando saí de lá fui a Belém. Levei um choque. E ainda aos 17 anos fui para o Rio de Janeiro. Mais choque. 

Passei uma década vivendo para lá e para cá, até que comecei, em 1982, a fazer faculdade de Jornalismo na Universidade Federal do Pará, em Belém. E haja leitura. Sempre foi uma das coisas mais prazerosas da minha vida. Ler, para mim, é como viajar com um cartão de crédito ilimitado. 

Mas essa conversa toda é para dizer o seguinte: a imersão e compreensão de um livro são relativas à nossa experiência. Já não consigo mais ler alguns livros. Por exemplo: O Jogo da Amarelinha, de Julio Cortázar. Passei a juventude ouvindo falar no romance e só o adquiri na velhice. Comecei a ler O Jogo com avidez, mas broxei rapidamente. Os longos diálogos entre os personagens já não significavam nada para mim. Na minha juventude, quando passava horas bebendo e batendo todo tipo de papo, teriam significado, mas, agora, não. 

Depois dos 70 anos, somos mais objetivos, pois temos a clara noção de que não há mais tempo. 

Quando li Suave é a Noite fiquei encantado com a Côte D’azur, aquelas mulheres longilíneas, as bebidas sofisticadas, os hotéis, a psiquiatria, a paixão. Recentemente, voltei a ler Suave é a Noite e não consegui mais. Depois dos 70 anos, tudo aquilo se foi. 

Comecei a me interessar mais por autores da era da informática, como John Grisan e Stieg Larsson. Comecei a me interessar por física quântica, pelo espírito. 

Os grandes escritores escrevem coisas do seu tempo, e, quando são realmente grandes, escrevem coisas que servem para qualquer tempo. Essa é a razão pela qual alguns livros envelhecem, como Suave é a Noite, ou Adeus às Armas, de Ernest Hemingway, mas são livros que melhor captam seu tempo, de modo que se quisermos saber como eram as coisas em determinado lugar e tempo basta procurarmos grandes romances que se passam nesse lugar e tempo. 

Assim é com Machado de Assis. Se quisermos ter uma visão viva do que foi o Rio de Janeiro entre os séculos 19 e 20, Machado é um dos escritores capazes de nos mostrar a Cidade Maravilhosa como em um documentário dirigido por um grande cineasta. 

É claro que meu ponto de vista é limitado a mim. Cada pessoa é um universo e viaja em um romance com lentes subjetivas, de modo que, além de mim, Suave é a Noite terá sempre sabor de champagne e perfume da Cote d’Azur, e Adeus às Armas, armistício pessoal. 

E alguns títulos de livro são inesquecíveis de tão completos em si mesmos. Tender is the Night foi retirado do poema Ode a um Rouxinol, de John Keats. Em 1962, virou filme, dirigido por Henry King, com música de Sammy Fain e letra de Paul Francis Webster, vertida para o português por Nazareno de Brito. 


É tão calma a noite

A noite é de nós dois

Ninguém amou assim

Nem há de amar depois

 

Quando o amanhã nos separar

Em nossa lembrança hão de ficar

Beijos de verão

Ternuras de luar

A brisa a murmurar

Sua canção

 

Tudo tem suave encanto

Quando a noite vem

A noite é só nossa

No mundo não há mais ninguém

 

Beijos de verão

Ternuras de luar

A brisa a murmurar

Sua canção

 

Tudo tem suave encanto

Quando a noite vem

A noite é só nossa

No mundo não há mais ninguém

 

Então, querida, estou à tua espera, a noite é só nossa. Sou como os jasmineros, que só sabem exalar perfume. Escrevo para viver, pois só com as palavras desnudo a luz e voo até o fim do mundo. Por isso, escrevo granadas intensas como buracos negros e garimpo o verbo como o primeiro beijo. Escrevo porque escrever traz aos meus sentidos cheiro de maresia, Dom Pérignon, safra de 1954, o labirinto do púbis no abismo do acme, mulher nua como rosa vermelha desabrochando. 

Agora, depois dos 70 anos, curto intensamente tudo o que tenho. Posso flutuar no éter só com o pensamento, ouvir riso de crianças, Mozart, o som da Terra no espaço, dormir, meditar, andar à toa, tomar tacacá, montar a luz, sentir o cheiro da mulher amada, transcender o tempo – o passado é cinzas atiradas ao vento e não há amanhã, mas só agora se eternizando. 

Depois dos 70 anos, enxergo a nudez das rosas e me interno, sem bússola, no mistério feminino, jamais desvendado, porque eterno. Descubro tesouros de valor inestimável, nos sentidos. Desenvolvi a capacidade de montar a luz, sentir o cheiro do mar, inalar o perfume dos jasmineros nas tórridas noites do mundo, em agosto, e em todos os meses. 

Depois dos 70 anos, sou tão bilionário quanto Elon Musk, pois voo ao plano astral, tenho telas de Olivar Cunha e, quando escrevo um poema, sinto a sensação do primeiro beijo. Meu coração tem sempre rosas que Isnard Brandão Lima Filho ofertou para a madrugada. 

Não desejo mais escalar o Pico da Neblina, pilotar um Boeing 777, praticar tiro ao alvo, saltar de paraquedas, internar-me na Amazônia, beber Cerpinha enevoada no quarto de um hotel, no sétimo andar, e dormir com a princesa, depois de matar com uma katana os assassinos que me perseguiam. 

Tudo o que quero é comparecer ao encontro marcado com a amada, embriagar-me com perfume pubiano, sentir a noite como um navio iluminado, ouvir o som da madrugada, diluir-me no acme e reaparecer no azul, sentir o sol no rosto, o mar, o Trópico. 

Depois dos 70 anos, não posso mais amar uma noite toda, nem beber três dias seguidos, nem ir muito longe, sozinho. Mas sonho sonhos ousados, salto, de asa delta, do Corcovado e pouso no Copacabana Palace. 

Vem, meu bem, estou à tua espera, vibrando de alegria, pois te esperar é como a emoção de encontrar a maior pepita de ouro no Morro do Salamangone, Serra Lombarda, município de Calçoene, no Amapá. É como a felicidade de abraçar crianças que escaparam de um naufrágio ao largo de Marajó, ver rosas nuas em toda parte só de te esperar, amor da minha vida. 

Esta noite será eterna porque nesta casa só haverá nós dois e a noite, presente de Deus para ti. Já arrumei tudo, as flores, o vinho e a comida, camusquim com camarão pitu. Seremos nós dois e os diamantes que garimpei toda a minha vida e que só encontramos no céu de Macapá, em agosto, nos anos 1960. Ouviremos Como é Grande o Meu Amor Por Você, Besame Mucho e Suave é a Noite, e dançaremos lentamente, nossos lábios se roçando. 

Sugarei colostro e sentirei o sabor do teu púbis, de madrugada, a quem ofertarei teus gemidos, que espalharei no jardim da minha alma, mulher amada. Vem logo, pois a noite já chegou, como um navio, um continente, uma galáxia. Só nossa!

quinta-feira, 23 de outubro de 2025

A vida é uma ilusão, uma festa permanente

A vida é saltar de asa delta do Pico da Neblina e pousar em Copacabana

RAY CUNHA 

O físico Albert Einstein disse que “a distinção entre passado, presente e futuro não passa de uma firme e persistente ilusão”. Com efeito, percebemos que crianças de colo não têm a menor noção de tempo, bem como adultos portadores de certas doenças neurológicas ou psiquiátricas. Assim, a noção de tempo só existe devido à percepção dos sentidos, especialmente a visão, já que o tempo é influenciado pela luz, é mera sensação de movimento. 

Na escuridão, o tempo não passa; mas, na luz, é vertiginoso, 300 mil quilômetros por segundo. Ao enxergar estrelas a 10 mil anos-luz de distância vemos o passado. Fotografias, o cinema, retém a luz dos acontecimentos, congela-os, imobiliza-os, anula o tempo. 

De forma que o tempo é uma sequência de movimentos, de dias e noites, noites e dias. O dia é dividido em 24 horas, as horas em 60 minutos, os minutos em 60 segundos. A rotação da Terra leva um dia; uma fase da Lua, uma semana; as fases da Lua, um mês; a translação da Terra, um ano. Uma década são 10 anos; um século, 100 anos; um milênio, mil anos. 

Na nossa casa o tempo é um, mas na casa dos nossos pais, que fica às vezes em outra cidade, ou em outro país, o tempo é outro. Os ursos sabem quando hibernar; uma árvore explode em flores no momento certo. Há tempo dos ipês roxos, dos amarelos e dos brancos. Há tempo de frio e o da primavera, tempo de vacas magras e de abundância. Bater um pênalti requer percepção do tempo, tanto para o jogador quanto para o goleiro. Sempre é tempo de amar. 

Einstein criou a teoria do espaço-tempo. O espaço é referencial necessário para que haja tempo, pois o espaço influencia o tempo, de maneira que, para fora, o tempo é relativo, e, para dentro, é o agora eterno. À medida que envelheço, desde as 5 horas daquela madrugada de 7 de agosto de 1954, sinto o tempo cada vez mais eterno. 

Desde então, o tempo tem sido a sensação de escalar o Pico da Neblina e saltar, lá de cima, de asa delta, em Copacabana; de mergulhar no azul montado na luz; de cair em um abismo para cima, como leão de asas, sentir a mulher amada, ouvir o silêncio da madrugada, como se ouve Mozart, viajar, em velocidade quântica, ao Rio de Janeiro, Hong Kong ou Andrômeda. 

Mas isso só é possível porque meu alicerce está encravado no meu coração, o portão astral, onde só há um tempo, aqui e agora, povoado de lembranças do meu pai contando histórias de aventuras, a sensação do abraço da minha mãe, o azul cobalto do céu nas tardes de agosto, como um rio imenso que deságua em noites de 200 mil metros cúbicos de perfume dos jasmineiros, por segundo, em Macapá, e as mulheres da minha vida, faróis em meio à tempestade, sinalizando-me a segurança do porto. 

O tempo não existe. E não poderia ser diferente, já que sem matéria não há tempo, e a matéria é também uma ilusão, sonho dos espíritos. Sonhamos com primaveras, com pessoas queridas, na festa permanente da vida!

quarta-feira, 22 de outubro de 2025

Clécio Luís, Davi Alcolumbre e Randolfe Rodrigues faturam a Margem Equatorial

Davi Alcolumbre, Randolfe Rodrigues e Clécio Luís contam
com o ovo ainda dentro da galinha, nas eleições de 2026

RAY CUNHA

BRASÍLIA, 22 DE OUTURBRO DE 2025 – O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) emitiu, segunda-feira 20, a licença que autoriza a Petrobras a começar a prospecção de petróleo a 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas, em alto-mar, na região conhecida como Margem Equatorial. O Observatório do Clima, que reúne 130 organizações ambientalistas, está se mordendo de raiva, rosnando que a decisão “vai contra o esforço de se manter o aquecimento global estável para impedir o agravamento das mudanças climáticas”. Mudança climática é cíclica e natural.

– Essa é uma região muito rica em biodiversidade e muito sensível. Ali, tem sistemas recifais, tem manguezais e tem comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais, que dependem da Amazônia costeira para sobreviver. Enquanto o mundo se volta para a Amazônia em busca de soluções para a crise climática, a gente vê essa licença sendo concedida para a abertura de mais um posto de petróleo, no coração do planeta. Ao mesmo tempo em que o Brasil se diz liderando a transição energética, investe numa dependência dos combustíveis fósseis. O que não faz nenhum sentido – cuspiu a coordenadora do GreenPeace Brasil, Mariana Andrade.

A cidade que mais fatura royalties de petróleo no Brasil é Maricá, na Grande Niterói, no litoral do Rio de Janeiro. Em 2023, faturou 2,4 bilhões de reais. Além de rica, é paradisíaca e berço da história do Brasil.

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, de 2024, o Amapá lidera o ranking de Estados mais violentos do Brasil, e a cidade de Santana, na Grande Macapá, a capital, é a mais violenta do país, juntamente com Macapá, uma das mais violentas. Santana, um dos mais importantes portos da Amazônia, é um entreposto do narcotráfico internacional. O Amapá é pobre e sofre apagões. Macapá não conta com rede de esgoto e, apesar de ser banhada pelo maior rio do mundo, o Amazonas, costuma faltar água encanada na cidade.

Em Macapá, três políticos, da Esquerda, ajustados com o presidente Lula da Silva e seu sistema da toga, já começaram a fazer propaganda, na mídia adestrada, faturando a Margem Equatorial, aparecendo como aqueles que se não fossem eles o Amapá não sairia da merda.

O primeiro deles é o governador do Amapá, Clécio Luís Vilhena Vieira (Solidariedade), que disputará a reeleição. Belenense, 53 anos, professor. Em 2012, foi eleito prefeito de Macapá pela de extrema Esquerda, o Partido Socialismo e Liberdade (Psol). Já foi também do PT.

O outro é Davi Samuel Alcolumbre Tobelem (União Brasil), macapaense, 48 anos, comerciante, presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional. Apesar de judeu, de ascendência marroquina, é o principal apoiador de Lula da Silva, que é antissemita, e do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, que mantém centenas de presos políticos, entre os quais parlamentares e jornalistas. Alcolumbre está na lista do presidente americano Donald Trump para receber sanções da Lei Magnitsky por apoiar Moraes.

O terceiro, Randolph Frederich Rodrigues Alves, mais conhecido como Randolfe Rodrigues (PT), deverá disputar sua reeleição ao Senado, em 2026. Conterrâneo de Lula, Rodrigues é de Garanhuns/PE, 52 anos, professor, líder do governo no Congresso Nacional, onde faz a defesa indefensável de Lula, que já limpou o Brasil e está se preparando para limpar a Margem Equatorial, a menos que sejam aprovadas a Anistia e eleições auditáveis, em 2026.

terça-feira, 21 de outubro de 2025

Presos do 8 de Janeiro estariam ingerindo comida com vidro e rato. Bolsonaro não duraria um dia na Papuda. Texto também em inglês

O presidente Bolsonaro quase foi transfixado no baixo ventre

RAY CUNHA

BRASÍLIA, 21 DE OUTUBRO DE 2025 – Segundo o jornal Gazeta do Povo, as marmitas que presos do 8 de Janeiro recebem na Penitenciária da Papuda, em Brasília, contêm pedaços de ratos, pedras e pequenos cacos de vidro. Também na Penitenciária Feminina do Distrito Federal, conhecida como Colmeia, a alimentação e higiene são insalubres, segundo a Defensoria Pública do Distrito Federal.

Mas na Papuda a coisa é para matar mais rapidamente. Segundo a advogada Taniéli Padoan, policiais penais registraram fotos de marmitas com comida estragada. Este é o pior pesadelo dos detentos, que sabem que vão morrer famintos.

“Além de nojo, eles estão sentindo medo também, porque já encontraram muita coisa nas marmitas, além de rato. Já foi encontrado canudo, pedra, caco de vidro, pedaço de luva, caramujo, enfim... Isso passa de todos os limites, porque estamos tratando de seres humanos” – disse Taniéli Padoan.

Segundo a conselheira da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal, Cristiane Damasceno, o tempo entre a produção e entrega dos alimentos aos presos pode ser um dos fatores responsáveis pela deterioração da comida.

“Por conta do alto número de detentos, é necessário produzir uma grande quantidade de comida muito cedo, logo no início da madrugada. Então, a hora do almoço só acontece ao meio-dia. Obviamente que quando as marmitas chegam a qualidade já não é mais a mesma” – raciocina Cristiane Damasceno. Em que momento, então, a granada venenosa é introduzida na comida?

Mais: entre os presos em geral há relatos do uso de gás lacrimogêneo, spray de pimenta e técnicas de imobilização, como o mata-leão, contra os detentos.

A superlotação é outro pesadelo. A Penitenciária da Papuda tem capacidade para abrigar 1.584 pessoas em regime fechado, mas hospeda 3.748 presos. Celas de seis metros quadrados, para duas camas, podem abrigar até 10 pessoas. Algumas celas para oito camas abrigam até 25 detentos. Alguns presos dormem no chão. No bloco de segurança máxima as celas são projetadas para duas pessoas, mas podem receber entre 8 e 10 presos por cela.

Na Papuda, pode-se morrer a qualquer momento, envenenado por comida estragada; por colapso cardíaco, devido ao estresse 24 horas por dia; ou por agressão física, tanto externa quanto pelos próprios presos.

O presidente Jair Messias Bolsonaro, acusado de liderar um golpe de Estado fantasioso, no dia 8 de janeiro de 2023, embora nem estivesse no Brasil, naquela data, está preso na sua própria casa, mas o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, ameaça enviá-lo para a Papuda.

Bolsonaro foi esfaqueado quase até a morte por um militante da Esquerda, Adélio Bispo de Oliveira, que, apesar de todas as evidências de que há um mandante, foi inocentado por diagnóstico de loucura e está em vias de voltar para as ruas. De modo que a saúde do maior líder da Direita brasileira é delicadíssima. Na Papuda, não duraria 24 horas. Bastaria uma marmita com pequenos cacos de vidro para acabar de vez com os intestinos de Bolsonaro.

Os livros O CLUBE DOS ONIPOTENTES e O OLHO DO TOURO relatam os bastidores da política no país, desde 2018. Em 2026, será publicado o último volume da trilogia. À venda no Clube de Autores e amazon.com.br

Segue texto em inglês:

Prisoners from January 8 are reportedly being served food containing glass and rat. Bolsonaro wouldn’t last a single day in Papuda

RAY CUNHA

BRASÍLIA, OCTOBER 21, 2025 – According to Gazeta do Povo, the meal boxes given to the January 8 prisoners in the Papuda Penitentiary, in Brasília, contain pieces of rats, stones, and tiny shards of glass. At the Women’s Penitentiary of the Federal District, known as Colmeia (“Hive”), both food and hygiene are described as deplorable by the Public Defender’s Office of the Federal District.

But in Papuda, things seem designed to kill faster. Attorney Taniéli Padoan reports that correctional officers have taken photos of spoiled food in inmates’ lunchboxes. This is the prisoners’ worst nightmare: they know they will die starving.

“Beyond disgust, they’re afraid,” said Padoan. “They’ve already found many things in the food besides rats — straws, stones, glass shards, pieces of gloves, snails… This goes beyond any limit, because we’re talking about human beings.”

According to attorney Cristiane Damasceno, a member of the Brazilian Bar Association in the Federal District, the time gap between food preparation and delivery may be one of the factors behind its deterioration.

“Because of the high number of inmates, a huge quantity of food has to be cooked very early, just after midnight. But lunch isn’t served until noon. Obviously, by then, the quality is gone,” she reasons.

At what point, then, is the poisonous grenade slipped into the food?

There are also reports of the use of tear gas, pepper spray, and chokeholds against inmates.

Overcrowding is another nightmare. Papuda has capacity for 1,584 inmates in a closed regime but houses 3,748. Cells of six square meters, meant for two beds, can hold up to ten people. Some designed for eight beds hold twenty-five. Some prisoners sleep on the floor. In the maximum-security block, cells built for two may hold between eight and ten inmates.

In Papuda, one can die at any time — poisoned by rotten food, from heart failure due to 24-hour stress, or from physical assault, either by guards or fellow inmates.

President Jair Messias Bolsonaro, accused of leading a fantastical coup d’état on January 8, 2023 — though he wasn’t even in Brazil at the time — remains under house arrest, while Supreme Federal Court Justice Alexandre de Moraes threatens to send him to Papuda.

Bolsonaro was stabbed nearly to death by a leftist militant, Adélio Bispo de Oliveira, who — despite overwhelming evidence of having an accomplice — was declared insane and is soon to be released. The health of Brazil’s greatest right-wing leader is extremely fragile. In Papuda, he wouldn’t last 24 hours. A single meal box containing tiny glass shards would be enough to shred Bolsonaro’s intestines for good.

The books O CLUBE DOS ONIPOTENTES (The Club of the Omnipotent) and O OLHO DO TOURO (The Eye of the Bull) unveil the backstage of Brazilian politics since 2018. In 2026, the final volume of the trilogy will be released. Available at Clube de Autores and amazon.com.br.

domingo, 19 de outubro de 2025

As veias abertas da América Latina foram seccionadas pelo coitadismo e comunistas. Donald Trump está suturando a sangria

Navios americanos cercam a Venezuela de Nicolás Maduro

RAY CUNHA

BRASÍLIA, 19 DE OUTUBRO DE 2025 – O ensaio As Veias Abertas da América Latina (1971), do escritor e jornalista uruguaio Eduardo Galeano, analisa a história da região desde o século 15, com a colonização europeia, até o século 20, atribuindo o fracasso econômico da região ao domínio dos europeus e Estados Unidos. O livro se refere também à hemorragia provocada pela matança dos índios.

O coitadismo de As Veias caiu imediatamente no gosto popular, razão pela qual foi amplamente usado pelos movimentos de esquerda na América Latina, principalmente na academia, em cursos de história, sociologia, antropologia, economia e geografia.

Quando o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, invadiu a Venezuela para capturar a hiena venezuelana Nicolás Maduro e aplicou a Lei Magnitsky no ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, braço direito do aborto de ditador Lula da Silva, a mídia com rabo preso começou a falar que ninguém podia violar a soberania brasileira.

O Brasil teve episódios de soberania, como na Guerra do Paraguai           e durante o governo de Jair Messias Bolsonaro (2019-2022), quando a diplomacia brasileira falava de igual para igual com qualquer potência hegemônica. Mas, agora, não tem mais soberania, que é, sobretudo, legitimidade, e economia pujante, poder de dissuasão, tecnologia e pesquisa de ponta.

O coitadismo é conversa mole de comunista. Os comunistas, que são a máfia mais virulenta do planeta, culpam o capitalismo, os ricos, como responsáveis pela miséria no mundo, e com essa conversa miserável enchem a cabeça da manada interminável de jumentos, as baratas da América Latina, cheios de autocomiseração e de teoria sobre direitos humanos.

Pois bem, em 1990, Fidel Castro, o dragão-de-komodo cubano; Lula da Silva, que dispensa apresentação; líderes comunistas; ditadores; narcotraficantes; terroristas; guerrilheiros; chefes de facções, ou quadrilhas; comunistas americanos escondidos no Partido Democrata; e toda espécie de bandido da América Latina, fundaram o Foro de São Paulo, com a missão de varrer os Estados Unidos do mapa.

A coisa deu certo. Começaram a pipocar ditaduras comunistas na região, os cartéis de drogas inundaram os Estados Unidos de todo tipo de droga, as fronteiras americanas foram arreganhadas para todo tipo de diabo, e as supremas cortes foram aparelhadas e os chefões do narcotráfico soltos.

Mas isso acabou em 20 de janeiro deste ano, quando Donald Trump assumiu a presidência dos Estados Unidos. Desde lá, Trump coalhou a América Central e está descendo para o Atlântico Sul com uma força bélica que não se via há algum tempo, embora com apenas um submarino e um porta-aviões o Tio Sam possa dar conta de todos os exércitos dos países ibero-americanos.

No momento, Trump está atrás de Nicolás Maduro, que se encontra em um buraco na Venezuela e será capturado ou morto a qualquer instante. Depois, Trump focará a ditadura de Cuba e os comunistas da Colômbia, até chegar ao Brasil.

Lula da Silva, o presidente brasileiro, que está dando todo seu apoio a Maduro, já declarou publicamente, ad nauseam, com registro na imprensa, que está trabalhando para acabar com o dólar, com Israel e com os Estados Unidos, e declarou apoio total e irrestrito não só a Maduro, mas também à China e ao Estado terrorista do Irã.

Trump tentou conversar com ele, mas Lula está irredutível: não falará com Trump, de quem parece que sente nojo. A última demonstração do seu poder de força foi dado recentemente: ameaça enviar para a Venezuela uma horda do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra) para, juntamente com as poderosas forças armadas de Maduro, porem Tio Sam para correr do Caribe.

As veias da América Latina continuem abertas, como tetas, das quais mana o rico leite da Petróleos de Venezuela S.A. (PDVSA), Petrobras, BNDES, INSS, Correios etc. etc. etc.

sábado, 18 de outubro de 2025

Ai de ti, Brasília!

A Praça dos Três Poderes é a embaixada do Brasil em Brasília

RAY CUNHA

1. Ai de ti, Brasília, pois é chegada a véspera de teu dia, o dia que abalará as tuas entranhas.

2. Ai de ti, Brasília, a ilha da fantasia, a Praça dos Três Poderes; cingiram tua fronte com uma coroa de ilusões e ficaste bêbeda de vão poder.

3. O Lago Paranoá inundará a Praça dos Três Poderes, e tu, bêbeda, não percebes os sinais; estás perdida e cega no meio das iniquidades do Planalto, do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.

4. Sem a Praça dos Três Poderes o Brasil será comandado pelo Primeiro Comando da Capital, pois foste iníqua perante a nação e o Lago Paranoá mandará sobre ti um turbilhão de água. E também as galerias de esgoto se revoltarão e despejarão sua imundície na cara dos ladravazes que se homiziam no Congresso Nacional.

5. Grandes são teus monumentos de concreto, e eles se postam diante do povo, dos turistas, impressionantes, qual muralha desafiando os submarinos e porta-aviões americanos; mas o que são muralhas perante o poder de fogo da Pax Americana?

6. Tubarões que andam em carros oficiais nas tuas ruas serão varridos pela vasa fétida do Paranoá; e o Umbral lançará ondas pútridas sobre ti, Brasília, em um referver de chorume, qual um bando de hienas em pânico, até morder a cara dos bandidos de colarinho branco; e todos os monumentos ruirão.

7. E os jacarés-açus, sucuris e todos os répteis, insetos e batráquios venenosos, habitarão os teus porões; as jararacas tomarão conta das lojas dos shoppings; as sucuris se entocarão em tuas galerias; escorpiões tomarão conta das tuas calçadas esburacadas, bombardeadas, mal cuidadas, desde sempre, e os banheiros públicos, pestilentos.

8. Tudo isso pela tua iniquidade, pela tua ganância, pelos assassinos da Praça dos Três Poderes. O Lago Paranoá, que vem refrescando a tua secura insaciável choverá sobre ti uma muralha de água.

9. Ai daqueles que roubam os aposentados do INSS e desprezam o riso das crianças, inclusive as crianças que ainda estão no útero da mãe; ai dos que roubam, estupram e matam, os que escravizam e torturam, os ditadores, os que desdenham do Senhor, pois o Senhor é a Lei.

10. Ai daqueles que passam nos carros negros, oficiais, antecedidos por batedores, pois ficarão apavorados quando chegar a hora da provação.

11. Nos eventos oficiais no Setor Hoteleiro Sul, as prostitutas se assanham como formigueiro atacado.

12. Uivai, canalhas, e clamai, prostitutas, porque Donald Trump está vindo.

13. Ai de ti, Brasília, porque os animais mais peçonhentos estarão nos poços de teus elevadores e minas terrestres no caminho do capo de tutti capi.

14. Brasília, o país todo, serão, então, libertados.

15. Por que rezais em público, políticos? Acaso, eu não conheço a multidão de vossos pecados, os crimes hediondos que habitam vossas mentes?

16. Antes que te percas, Praça dos Três Poderes, ficarás demente e enlouquecerás, e só então conhecerás o inferno. Os brasilienses crescerão sobre os palácios dos três poderes como uma explosão, engrossada por brasileiros de todos os Estados, jogando pedra na cara dos ditadores, e, finalmente, Tio Sam lavará os teus pecados com lança-chamas.

17. E tu, Ornstein, ouve a minha ordem: reserva para Jair Messias Bolsonaro o teu palácio, porque, ali, ele habitará.

18. E no Coco Bambu os carcarás comerão cabeças de políticos e Caetano Veloso e Fafá de Belém cantarão para zumbis.

19. Pois grande foi a tua vaidade, Brasília, a Brasília da Praça dos Três Poderes, por isso, fundas são as tuas desgraças. O Planalto, a Praça dos Três Poderes e toda a Esplanada ficarão em chamas. E não viste o sinal. Pois o fogo e a água te consumirão. Consumirão a tua soberba, a tua arrogância extrema.

20. A rapina dos políticos e a ostentação das suas prostitutas já consumiram diamantes coagulados das lágrimas de mil meninas miseráveis – tudo passará e vocês não vão levar nada para o além, mas somente suas emoções lamacentas.

21. Assim, as sucuris de doze metros e os jacarés-açus de seis metros e mil quilos de peso estarão atentos para recepcioná-los, embora alguns desses bichos morrerão por tomarem bebidas falsificadas e comerem comida estragada em teus bares e restaurantes.

22. Pinta-te como puta e coloca todas as tuas bijuterias, aviva o verniz de tuas unhas postiças, longas como garras, e grasna as músicas horrorosas desta época medíocre, curte com intensidade o prazer, que é sempre ilusório, nunca é alcançado. É tarde para a prece. Nem batom te libertará.

23. Haverá maior símbolo de liberdade do que batom vermelho escrito na Justiça? É como desvendar-lhe os olhos do espírito e libertar o mundo de toda maldade. Condenada a não veres teus filhos crescerem, agora, és heroína, Débora, e grilhão algum, ninguém te deterá no interminável espaço, nada cessará a luz que disseminas no éter. Batom é como pétalas de rosas rubras que nascem nos jardins até o fim do Universo, que Deus disseminou como perfume azul. Batom, mesmo que escrito no duro granito, como pode ameaçar o Estado de direito, se batom é preciso, viver não é preciso?

24. A fúria de Donald Trump reconhecerá imediatamente teu corpo obeso e cheio de máculas, e o destruirá. Canta a tua última canção imunda, Praça dos Três Poderes! 

Brasília/DF, outubro, 2025

Esta crônica é baseada em Ai de ti, Copacabana!, de Rubem Braga

Segue o texto em inglês, em tradução do ChatGPT:

Woe unto thee, Brasília!

RAY CUNHA

Woe unto thee, Brasília, for the eve of thy reckoning has come—the day that shall shake thy very entrails.

Woe unto thee, Brasília, island of fantasy, Praça dos Três Poderes; they have girded thy brow with a crown of illusion, and thou hast grown drunk with vain power.

Lake Paranoá shall flood the Praça dos Três Poderes, and thou, drunken, seest not the signs; lost and blind amidst the iniquities of the Plateau, of the National Congress, and of the Supreme Federal Court.

Without the Praça dos Três Poderes, Brazil shall be ruled by the First Command of the Capital, for thou hast been unjust before the nation, and Lake Paranoá shall send upon thee a whirlwind of water. Even the sewage tunnels shall revolt and vomit their filth upon the faces of the thieves who hide within the National Congress.

Great are thy monuments of concrete, standing before the people and the tourists, imposing as walls defying the American submarines and aircraft carriers; but what are walls before the firepower of the Pax Americana?

The sharks that ride in official cars along thy streets shall be swept away by the fetid sludge of Paranoá; and the Lower Abyss shall hurl its putrid waves upon thee, Brasília, in a boiling of leachate, like a horde of panicked hyenas, biting the faces of white-collar criminals; and all the monuments shall crumble.

And the giant caimans, anacondas, and all manner of reptiles, insects, and venomous toads shall inhabit thy basements; the jararacas shall take over the shops of thy malls; the anacondas shall coil within thy galleries; scorpions shall claim thy cracked sidewalks—bombarded, neglected, pestilent since the beginning—and thy public lavatories, rank with stench.

All this for thy iniquity, thy greed, the murders of the Praça dos Três Poderes. Lake Paranoá, which cools thy insatiable dryness, shall pour upon thee a wall of water.

Woe unto those who rob the pensioners of the INSS and scorn the laughter of children—even the unborn; woe unto the thieves, rapists, and murderers, the enslavers and torturers, the dictators, the mockers of the Lord—for the Lord is Law.

Woe unto those who glide past in black official cars, preceded by outriders, for they shall tremble when the hour of trial comes.

At official events in the Southern Hotel Sector, prostitutes stir like an anthill under attack.

Howl, you scoundrels, and cry out, you harlots, for Donald Trump is coming.

Woe unto thee, Brasília, for the most venomous creatures shall dwell in the shafts of thy elevators, and landmines shall lie in the path of the capo di tutti capi.

Then Brasília—and all the nation—shall be delivered.

Why do ye pray in public, politicians? Think ye that I know not the multitude of your sins, the monstrous crimes that inhabit your minds?

Before thou art lost, Praça dos Três Poderes, thou shalt go mad and be driven to insanity; only then shalt thou know hell. The people of Brasília shall rise over the palaces of power like an explosion—swelled by Brazilians from every state—casting stones at the faces of dictators, and at last Uncle Sam shall cleanse thy sins with flamethrowers.

And thou, Ornstein, hear my command: reserve thy palace for Jair Messias Bolsonaro, for there he shall dwell.

And at Coco Bambu the carcarás shall feast upon the heads of politicians, while Caetano Veloso and Fafá de Belém sing to the zombies.

For great was thy vanity, Brasília—the Brasília of the Praça dos Três Poderes—therefore deep are thy misfortunes. The Plateau, the Praça, and all the Esplanade shall be in flames. And thou sawest not the sign. For fire and water shall consume thee—consume thy pride, thy supreme arrogance.

The plunder of politicians and the display of their prostitutes have already devoured diamonds congealed from the tears of a thousand wretched girls. All shall pass—and ye shall carry nothing beyond the grave but your muddy emotions.

Thus the twelve-meter anacondas and the six-meter, thousand-kilo caimans shall stand ready to welcome you—though some of these beasts shall perish from drinking counterfeit liquor and eating spoiled food in thy bars and restaurants.

Paint thyself like a whore and don all thy trinkets; revive the varnish on thy false nails, long as talons, and croak the horrid songs of this mediocre age. Indulge in pleasure—it is always illusion, never attained. It is too late for prayer. Not even lipstick shall save thee.

Is there a greater symbol of freedom than red lipstick scrawled upon Justice? It is as if unveiling the eyes of the spirit and freeing the world from all evil. Condemned never to see thy children grow, thou art now heroine, Débora, and no chain, no man shall halt thee in the endless expanse—nothing shall still the light thou scatterest through the ether. Lipstick is like crimson rose petals blooming in gardens to the end of the Universe, which God has spread like a blue perfume. Lipstick—even written upon hard granite—how could it threaten the rule of law, if lipstick is precision, and living is not?

The wrath of Donald Trump shall recognize at once thy obese, blemished body—and destroy it. Sing thy final filthy song, Praça dos Três Poderes!

Brasília, Federal District – October, 2025

This chronicle is based on “Ai de ti, Copacabana!” by Rubem Braga.