RAY
CUNHA
BRASÍLIA,
21 DE ABRIL DE 2025 – Brasília/DF, a
capital do Brasil, atualmente com democracia meia-boca, completa, hoje, 65 anos
de fundação. A Papuda é sua penitenciária, onde estão presos políticos,
acusados de tentarem um golpe de Estado em 8 de janeiro de 2023, armados de
batom e pipoca. Seus arquitetos, Lúcio Costa e Oscar Niemeyer, eram comunistas
e desenharam uma cidade comunista, que, de certa forma, parece um cemitério,
mas sem alma.
Ergue-se no Planalto Central, a 1.172
metros acima do nível do mar, na região Centro-Oeste do país, tem 2.817.381
habitantes, é a terceira cidade mais populosa do país e a maior cidade do mundo
construída no século XX. Uma Babel de sotaques, predominando o mineiro, goiano,
paulista e nordestino. Seus escritores defendem que a cidade, embora ainda em
cueiros, já tem literatura própria.
É uma cidade feita para quem tem automóvel e, embora
planejada e tão jovem, é um três por quatro do país em dois quesitos: cheia de
favelas, vendedores ambulantes, pedintes e moradores de rua; e deteriorada.
Entre em um banheiro público, na Rodoviária Interestadual, por exemplo. Dá vontade
de vomitar. E muitas das calçadas, quando as há, dá a impressão de que foram
bombardeadas.
Apesar de planejada, fora do Plano Piloto, que é o centro da
cidade, a fiação elétrica é aérea, motivo pelo qual muitas árvores ficam com apenas
uma banda, para não prejudicar a fiação. Quanto ao policiamento, trata-se de um
problema federal, pois os policiais estão cada vez mais desarmados e ameaçados
de eles mesmos serem presos e não os bandidos.
Em 31 de janeiro de 1956, Juscelino
Kubitschek toma posse. Vendo que não conseguiria chegar ao fim do seu mandato,
em 31 de janeiro de 1961, se a capital continuasse no Rio de Janeiro,
aproveitou uma ideia que começou no Brasil-Colônia, no século XVIII, de
transferir a capital do Brasil para o interior do país.
Um dos primeiros a pensar nisso foi
Sebastião José de Carvalho e Melo, Marquês de Pombal, primeiro-ministro de Dom
José I, entre 1750 e 1777. Pombal, um dos mais destacados representantes do
despotismo esclarecido, responsável por reformas que catapultaram a economia do
reino e das colônias, sugeriu, em 1761, que a capital do Brasil-Colônia fosse
transferida para o interior do país, e contratou o cartógrafo italiano
Francesco Tosi Colombina para estudar a geografia do Planalto Central,
epicentro da imensa colônia.
Em 1789, ano da Revolução Francesa,
Joaquim José da Silva Xavier, mais conhecido como Tiradentes, também pensou em
uma nova capital, mas em um país independente. Tiradentes nasceu na Fazenda do
Pombal, próxima ao arraial de Santa Rita do Rio Abaixo, disputado, à época,
pelas vilas de São João del-Rei e São José del-Rei, no hoje município de
Ritápolis/MG, e foi batizado em 12 de novembro de 1746. Dentista, tropeiro,
minerador, comerciante, militar e ativista político, foi um dos líderes da
Inconfidência Mineira, conspiração separatista do Brasil-Colônia de Portugal.
Tiradentes foi preso, julgado, enforcado publicamente, esquartejado e seu corpo
exposto, em 21 de abril de 1792, no Rio de Janeiro.
Após o golpe da República, em 15 de
novembro de 1889, os golpistas, visando criar uma identidade republicana e
enterrar o império, tornaram Tiradentes herói nacional, patrono cívico do
Brasil e das polícias militares e civis. O 21 de Abril é feriado nacional. Em
Minas Gerais, a antiga Vila de São José do Rio das Mortes foi renomeada cidade
de Tiradentes em sua homenagem. Mitificado, pintam-no à semelhança do Jesus
Cristo hollywoodiano. A iconografia tradicional de Tiradentes é de um homem de
cabelos e barbas longas, como Jesus Cristo, no cadafalso. Porém, como militar,
o máximo que Tiradentes poderia ter no rosto seria um discreto bigode. Na
prisão, onde esperou ser executado durante três anos, teve barba e cabelo raspados,
para evitar piolho.
Em 1808, dom João VI e sua corte
fugiram da iminente invasão de Portugal pelo imperador francês Napoleão
Bonaparte e foram para o Rio de Janeiro, então uma pequena cidade, incompatível
para abrigar a corte de Portugal. Também, na época, a localização costeira do
Rio de Janeiro deixava a cidade vulnerável a ataques estrangeiros pelo mar. No
século XVI, os franceses conquistaram facilmente a Baía de Guanabara e
instalaram a França Antártica. No século XVIII, corsários franceses tomaram o
Rio e só o libertaram após dois meses, quando receberam um gordo troféu para
deixarem a cidade.
Em 1813, a interiorização da capital
ganhou as páginas do influente Correio
Braziliense, editado por Hipólito José da Costa, para quem a nova cidade
deveria ser construída na capitania de Goiás, no ponto onde nascem “caudalosos
rios que se dirigem ao norte, ao sul, ao nordeste e ao sudeste”. Segundo
Hipólito, isso permitiria o contato fluvial da capital com todo o território
brasileiro. O que não é verdade.
Em 1823, o ministro e deputado José
Bonifácio de Andrada e Silva (SP), conhecido como Patriarca da Independência,
propôs à Assembleia Constituinte a transferência da capital para o interior e
sugeriu que se chamasse Brasília. “Como essa cidade deve ficar equidistante dos
limites do Império tanto em latitude como em longitude, vai-se abrir, por meio
das estradas que devem sair desse centro como raios para as diversas
províncias, uma comunicação e decerto criar comércio interno da maior magnitude.
Vai-se chamar para as províncias do sertão o excesso da povoação sem emprego
das cidades marítimas e mercantis” – propôs Bonifácio.
Só que Dom Pedro I dissolveu a
Assembleia Constituinte e a transferência da capital foi para a gaveta, tanto
que na Constituição imposta pelo imperador, em 1824, não se fala nisso.
Mas no reinado de Dom Pedro II, a
campanha pela nova capital renasceu, encabeçada pelo historiador Francisco
Adolfo de Varnhagen. Ele argumentava que a permanência da sede do Império no
Rio significava a continuidade do atraso colonial, que a entrada do Brasil na
modernidade dependia dessa transferência.
Inspirado por Varnhagen, o senador
(1838-1863/PE) Antônio Francisco de Paula de Holanda Cavalcanti de Albuquerque,
Visconde de Albuquerque, apresentou um projeto de lei prevendo uma nova
capital. Para ele, o sertão teria boa utilidade se fosse ocupado por plantações
de café, então o motor da economia nacional.
“O Brasil deve, em minha opinião, ser
mais uma nação agrícola do que comercial. Ora, o desenvolvimento da agricultura
em vasta escala não poderá conseguir-se senão promovendo-se a formação de
grandes estabelecimentos no centro do Império. O meio mais óbvio que se antolha
para realizá-los é a criação da capital nesse centro” – argumentou. Segundo
ele, a cidade poderia ficar pronta em dez anos, usando como mão de obra
escravos negros, que, aliás, construíram o Brasil debaixo de chicote, até a Lei
Áurea, assinada em 13 de maio de 1888, pela Princesa Isabel, quando os negros
passaram a outra casta, de escravos para marginais; poderiam ser presos até por
olharem nos olhos de uma autoridade, ou policial. A proposta foi para a gaveta
e o Cerrado não foi ocupado por cafezais, mas, depois da inauguração de
Brasília, em 21 de abril (Tiradentes) de 1960, por extensas plantações de soja.
Em 1877, Varnhagen partiu para a ação.
Embrenhou-se pelos sertões do Planalto Central para identificar o ponto onde
seria construída a nova cidade, que se chamaria Imperatória, em homenagem ao
imperador Dom Pedro II, e seria construída exatamente entre as lagoas Formosa,
Feia e Mestre d’Armas.
O tema foi desengavetado na Assembleia
Constituinte de 1891, após a derrubada da Monarquia. O senador constituinte
Virgílio Damásio (BA) apresentou uma proposta denominando a nova capital do
Brasil de Cidade Tiradentes e argumentou que o Rio de Janeiro estava inchado,
com 400 mil moradores; um barril de pólvora.
“Nesta cidade populosa, falemos a
verdade, encontram-se muitos que vivem entre a ociosidade e manejos ou
expedientes poucos confessáveis. Essa grande massa de homens é uma arma, uma
alavanca poderosíssima em mãos de agitadores. Uma cidade populosa não convém
para capital” – disse.
O deputado constituinte Thomaz Delfino
(DF) concordou com Virgílio Damásio. “Uma capital não se sente muito bem no
meio da multidão da vasta cidade, por sua natureza agitada e, de vez em quando,
algum tanto revolucionária. É sabido que nos Estados Unidos da América do Norte
os diferentes estados têm geralmente pequenas cidades por capitais. A sede do
governo do estado de Nova York não é a riquíssima cidade desse nome e sim a
insignificante Albany. Quando a capital da União Americana foi fixada em
Washington, era esta apenas uma pequena cidade de 70 a 80 mil habitantes” –
argumentou.
Com efeito, a deposição de Dom Pedro II
era um nervo exposto. Inclusive, dom Pedro II poderia ter resistido, pois teve
todo o apoio necessário para isso, mas parece que ele queria mesmo era se
aposentar, e a herdeira do Império, a princesa Isabel, era mais beata do que
estadista. Havia a preocupação, por parte dos republicanos, de uma insurreição
pela volta do Império. A minoria republicana que deu o golpe contra o Império
não contava com respaldo popular; o Rio de Janeiro era monarquista. Durante os
governos de Deodoro da Fonseca (1889-1891) e Floriano Peixoto (1891-1894),
ambos militares, o Rio foi bombardeado por navios de guerra dos insurgentes da
Revolta da Armada.
Mas como a Constituição de 1891 previa
a construção de um novo Distrito Federal no centro do Brasil, os dois primeiros
presidentes da República, Deodoro e Floriano, seguiram a lei e criaram uma
comissão de técnicos para delimitar, no interior de Goiás, o quadrilátero da
futura capital. Em 1892, o belga Louis Cruls mapeou um território no Planalto
Central para a construção da nova capital.
Mas o sucessor de Deodoro e Floriano, e
primeiro civil a ocupar a Presidência da República, Prudente de Moraes
(1894-1898) engavetou o plano, argumentando que os cofres públicos não tinham
dinheiro para a empreitada. Contudo, o motivo era outro. Quem então mandava no
país eram as oligarquias nos estados, porque eram quem sustentavam o Estado, e
eles não queriam que a capital saísse do Rio, embora o Rio estivesse
fervilhando, inclusive Prudente de Moraes escapou por um triz de ser assassinado
a espada, durante a cerimônia de boas-vindas às tropas que haviam massacrado
Canudos.
No governo de Rodrigues Alves
(1902-1906), que sucedeu Campos Salles (1898-1902), o Rio foi depredado pelos
cariocas na Revolta da Vacina.
Em 1905, o senador Nogueira Paranaguá
(PI) apresentou projeto de lei dando prazo para a mudança da capital, até 1921,
cem anos da Independência do Brasil. Paranaguá argumentou que o Rio não
espelhava o Brasil: “Esta é uma cidade cosmopolita por excelência. Aqui, há o
elemento português, o italiano, o alemão, o espanhol e muitos outros. Os
estrangeiros têm força preponderante. Os interesses desta cidade são muitas
vezes antagônicos com o interesse nacional. Eu quero uma capital tranquila,
verdadeiramente nacional, em que o brasileirismo seja predominante” – disse.
Além disso, alegava que o clima do Rio não era bom: “Neste momento, estou a
sentir um calor senegalesco. Eu estou transpirando, apesar destes ventiladores.
Nós vemos que o próprio presidente da República se retira da capital durante
alguns meses do ano por não poder ficar neste clima asfixiante”. E arrematou:
“No Planalto Central, teríamos uma capital que reuniria todas as condições de
salubridade”.
Naquela época, não havia aparelho de
ar-condicionado no Brasil, que só começou a utilizá-los na década de 1940. O
Rio, cercado pela Baía de Guanabara, era rodeado de pântanos, ambiente propício
para a disseminação de cólera, peste bubônica e febre amarela. Rodrigues Alves,
o primeiro presidente eleito no século XX, executou uma reforma radical na
região portuária do Rio para combater a insalubridade, demolindo cortiços e
construindo amplas avenidas, praças e edifícios públicos, uma Paris tropical.
Não queria nem ouvir falar em capital no Planalto Central.
Mas, em 1922, é construído um obelisco
na zona rural de Planaltina/DF, a mando do presidente Epitácio Pessoa
(1919-1922). Em 1929, o intelectual Theodoro Figueira de Almeida publicou um
plano da futura cidade, que teria ruas e praças com nomes que contariam a
história do Brasil desde Pedro Álvares Cabral. Ainda em 1922, o
tenente-coronel Luiz Mariano de Barros Fournier, professor da Escola Militar,
apresentou ao Senado uma parceria público-privada que lhe permitiria liderar a
construção da nova capital. O governo só teria que providenciar 67 mil contos
de réis e o tenente-coronel entregaria a cidade pronta, em 1931.
“O proponente permite-se assegurar-lhes
que conhece perfeitamente o problema que se propõe resolver, que, educado em
severo regime militar, tem inteira noção do que seja responsabilidade e que o
exercício de suas funções no magistério militar é uma prova de que se acha em
pleno gozo de perfeita razão” – negociou o tenente-coronel. Os senadores
agradeceram a proposta e a engavetaram imediatamente.
Durante os trabalhos da Assembleia
Constituinte de 1934, o deputado Nero de Macedo (PSR/GO) lamentou: “As
circunstâncias já têm demonstrado a necessidade de uma nova capital. Os
governantes, porém, ou por pirronice, ou por inércia, jamais cumpriram o
dispositivo constitucional. Nós conhecemos bem os costumes políticos,
conhecemos bem o encanto que tem o Rio de Janeiro”.
A Revolução de 1930 enfraqueceu as
oligarquias estaduais e a transferência da capital para o Planalto Central
voltou com força à Constituição de 1934. Foi nesse clima que o diretor do
Serviço de Informações e Estatísticas do Ministério da Educação, Mário Augusto
Teixeira de Freitas, propôs ao governo de Getúlio Vargas a transferência da
capital para o interior, aos poucos. Assim, Belo Horizonte, a capital mineira,
planejada e fundada em 1897, tornar-se-ia a capital provisória do país, até que
as obras da nova capital, Cabrália (em homenagem a Pedro Álvares Cabral,
descobridor do Brasil) fosse construída em Goiás. Teixeira de Freitas não
conseguiu nada com Getúlio Vargas, mas, em 1938, ajudou a fundar o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que endossou o projeto em duas
etapas da nova capital.
Na Assembleia Constituinte de 1946,
convocada após a queda da ditadura do Estado Novo, os parlamentares acharam que
em vez de Belo Horizonte a capital seria Goiânia, inaugurada em 1942.
“Não vemos como se possa realizar, nos
próximos decênios, a obra ciclópica da nova capital do Brasil, que deve ser
projetada com a maior perfeição e caprichosamente executada, para não
prejudicar o futuro do país. Planificada e construída em moldes moderníssimos,
é Goiânia a cidade ideal, entre todas as suas irmãs, para sede provisória do
governo da República. Ela já está ali à nossa vista, ao nosso alcance” – propôs
o deputado constituinte Diógenes Magalhães (PSD/GO).
Os constituintes da bancada de Minas
Gerais reagiram a Diógenes Magalhães e ofereceram o Triângulo Mineiro para o
novo Distrito Federal, inclusive o deputado Juscelino Kubitschek (PSD/MG):
“Trago ao conhecimento dos senhores representantes um magnífico trabalho de
autoria do secretário de Viação do estado de Minas Gerais. Nele, além de
sugerir a mudança da capital para o pontal do Triângulo Mineiro, são estudados
os variados aspectos do problema e apontada uma solução que satisfaz os
partidários da ideia da mudança da capital” – discursou Juscelino, em 1946.
Durante o governo Nereu Ramos
(1955-1956), em 1955, foi enviada nova missão ao Planalto Central, a qual
recomendou que o Distrito Federal fosse criado no mesmo local, em Goiás, já
delimitado na época de Floriano Peixoto, e que a futura cidade fosse chamada de
Vera Cruz, um dos nomes dados ao Brasil logo depois do Descobrimento.
Em 1955, Juscelino Kubitschek, fruto de
uma coligação entre o Partido Social Democrático (PSD) e o Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB), ambos ligados ao ditador Getúlio Vargas, disputou a
Presidência da República. Na campanha, sentiu que se fosse eleito não chegaria
ao fim do seu mandato se a capital continuasse no Rio de Janeiro. Assim,
prometeu construir Brasília. Empossado, em 1956 (até 1961), dedicou seu governo
à sua promessa. Abriu um concurso para o Plano Piloto da nova cidade, vencido
pelo arquiteto e urbanista Lucio Costa, de modo que a construção de Brasília
faria com que ele se ausentasse amiúde daquele barril de pólvora e mantivesse
seu nome aceso em nível nacional.
“Juscelino poderia ter descumprido a
promessa. Nada o obrigava a cumpri-la. Ele não seria o primeiro político a não
cumprir a totalidade do seu programa eleitoral. O que ocorreu foi que
Juscelino, um herdeiro do getulismo, se elegeu com apenas 35% dos votos, e
setores conservadores da política e das Forças Armadas, os mesmos que haviam
levado Getúlio ao suicídio, questionaram essa vitória. No fim de 1955, houve duas
tentativas de golpe de Estado para impedir a posse de Juscelino. No início de
1956, uma revolta militar tentou derrubá-lo. Nesse ambiente hostil, Juscelino
percebeu que a transferência da capital tinha a capacidade de mobilizar o
imaginário da nação e colocá-la ao seu lado. Foi por isso que levou a ideia
adiante” – analisa o historiador francês Laurent Vidal, autor do livro De Nova Lisboa a Brasília (Editora
UnB).
Para Vidal, os brasileiros desconhecem
a história de todas as Brasília imaginadas, de modo que JK conseguiu criar para
si a imagem do mito que fez tudo sozinho: “É importante que os brasileiros
conheçam a história completa de Brasília para que, assim, conheçam a si
próprios. A ideia de uma nova capital no Planalto Central apareceu de tempos em
tempos, sempre em momentos de crise e ruptura, como forma de reaglutinar o país
dividido. Foi assim após a Independência, após a Proclamação da República, após
a Revolução de 1930, após a ditadura do Estado Novo. A nova capital sempre
trouxe essa ideia de progresso, de modernidade, o que mexe forte com o
imaginário das pessoas. Mas, na avaliação dos governantes, bastava formular o
projeto. Não era preciso ir até o fim. Por 150 anos, o importante foi apenas
superar as crises”.
Brasília foi inaugurada em 21 de abril
de 1960. Os militares adoraram. Em 1964, deram um golpe. Em Brasília, naquela
época, não existia a possibilidade de protesto popular. Nem povo Brasília
tinha, ainda. A Ditadura dos Generais durou até 1985.
E há o mito de que São João Bosco, italiano,
fundador da Congregação dos Salesianos, teria sonhado com Brasília, em 1883, e
profetizado a construção da cidade, segundo o livro Memórias Biográficas de São João Bosco, de seu assistente, padre
Lemoyne. Em agosto de 1883, Dom Bosco sonhou que fazia uma viagem à América do
Sul, onde jamais esteve. No sonho, visitou um território que ia da Colômbia ao
sul da Argentina. Segundo ele: “Entre os graus 15 e 20 havia uma enseada
bastante longa e bastante larga, que partia de um ponto onde se formava um lago.
Disse então uma voz repetidamente: – Quando se vierem a escavar as minas
escondidas no meio destes montes aparecerá aqui a terra prometida, de onde
jorrará leite e mel. Será uma riqueza inconcebível”.
Diz-se que o lago mencionado por Dom
Bosco é o Lago Paranoá. A primeira obra de alvenaria erguida na nova capital
foi a Ermida Dom Bosco, uma pequena capela piramidal projetada por Oscar
Niemeyer, às margens do Lago Paranoá, construída em 1957, em homenagem ao
santo, que se tornou padroeiro de Brasília, juntamente com Nossa Senhora
Aparecida, e os Salesianos foi a primeira ordem religiosa a chegar a Brasília,
em 1956, atuando nos acampamentos dos candangos.
Vim para cá em 1987. Ia para o Rio de Janeiro. A caminho,
hospedei-me na casa de um casal de amigos, o jornalista Walmir Botelho e sua
esposa, Deury Farias. O Walmir tinha acabado de assumir a diretoria de redação
do jornal Correio do Brasil e me
convidou para ajudá-lo no fechamento da capa, prometendo que dali a três meses
conseguiria vaga para mim no Jornal do
Commercio do Rio, pois o diretor de redação do Jornal do Commercio era amigo do Walmir.
Acabou que em vez de vaga começaram a demitir no Jornal do Commercio, eu casei e nasceu
minha princesinha. Até hoje estou em Brasília. Em 1987, quando cheguei aqui, logo
depois o governador Joaquim Roriz começou o que eu chamo de segunda fase da
construção de Brasília, que era ainda o quintal de São Paulo. Hoje, é uma
cidade grande, com sotaques de todo o Brasil, as embaixadas estrangeiras,
restaurantes com todo tipo de comida, e a sensação de que estamos em Minas Gerais
e em Goiás. Não à toa seu fundador, Juscelino Kubitscheck, era mineiro, e o
Distrito Federal é um naco de Goiás.
Quanto aos cariocas, têm um bairro quase só de cariocas, o
Cruzeiro, sede da maior escola de samba de Brasília, a Associação Recreativa
Unidos do Cruzeiro (Aruc), e os cariocas estão em toda parte na administração
federal e distrital, afinal, a capital era deles.
Brasília tem bons shoppings, cinemas, restaurantes, bares,
cafés, padarias, livrarias, feiras, clubes para todos os gostos e bolsos, e,
claro, pamonharias. O Parque da Cidade é ótimo para caminhadas e o Lago Paranoá,
uma beleza. O Sudoeste, que fica ao lado do Parque da Cidade, é o melhor bairro
da cidade, onde se come bem e a noite demora a terminar.
O romance HIENA e o livro de contos TRÓPICO, deste autor, revelam
as duas Brasília: a de Oscar Niemeyer e a do Congresso Nacional, para onde os
brasileiros de todos os rincões enviam seus mais destacados cidadãos, mas
também os mais perigosos bandidos. Tanto um como o outro estão à venda no Clube de Autores, amazon.com.br e amazon.com