segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Romance ensaístico despe a Amazônia e mostra sua tragédia e beleza, inclusive o plano espiritual

Capa da edição do Clube de Autores

Por RAY CUNHA 

BRASÍLIA, 23 DE AGOSTO DE 2021 Festival de Gastronomia do Pará e Amapá, no monumental Hotel Caranã, bairro do Pacoval, em Macapá/AP, a cidade mais emblemática da Amazônia. A Fortaleza de São José de Macapá, o maior forte colonial português, é também o maior ícone dos macapaenses, a tradução perfeita de Macapá. Construída por escravos, negros e índios, debaixo do látego do colonizador português, foi o cadinho no qual se forjou a etnia macapaense. 

Os portugueses cruzaram com africanos e geraram mulatos, e fornicaram com os índios, formando uma população de mamelucos; os africanos fundaram os bairros do Curiaú e do Laguinho, misturaram-se com os índios e legaram cafuzos; e mulatos, cafuzos e mamelucos misturaram-se, fechando o círculo, numa diversidade étnica viva nas ruas de Macapá, nas nuanças de peles que vão do alabastro ao ébano, passando pelo bronze e jambo maduro, unidos pelo sotaque caboco: a fusão do português falado em Lisboa, doces palavras tupis, línguas africanas, patoá das Guianas, tudo triturado em corruptela. 

Nesse cadinho étnico, o jambu é a erva que melhor sintetiza a Amazônia. Os amazônidas, sedados pelo sol equatorial, que, apesar dos 100% de umidade relativa do ar, esturrica tudo, e acossados pela grande floresta, microrganismos, insetos e animais peçonhentos, agem como as papilas gustativas entorpecidas por espilantol, presente no jambu, principalmente na sua flor: anestesiados, baixam a cabeça e se entregam aos seus carrascos, especialmente os políticos, que, independentemente de serem da própria terra, ou de fora, são inclementes como os antigos ibéricos. 

Os políticos uniram-se a um tipo de empresário escravocrata e que adora dinheiro, e passaram a gerir a senzala sem paredes, ampliando a Fortaleza de São José de Macapá a ventre da besta. A Amazônia está sempre coalhada de colonos e aventureiros: tecnocratas de Brasília; paulistanos que compram 90% das toras de árvores griladas; americanos que nunca desistiram de colonizar o subcontinente; japoneses ávidos em ampliar seu arquipélago; chineses acossados pela própria superpopulação; os europeus de sempre, além dos políticos, especialmente os comunistas, disfarçados de fabianos, sequiosos em vender – e embolsar o dinheiro – até a última árvore, a última pedra preciosa, e todas as mulheres e crianças que puderem. 

Nesse cenário, do suplício imposto pelos ibéricos, da morte decretada pelos microrganismos e o assalto e o desprezo perpetrado pelos políticos, os macapaenses se tornaram símbolo de um tempo antigo, persistente, de espanhóis e portugueses, colonos e colonizados, o drama que perpassa a Ibero-América, a tragédia da Amazônia, alicerçado pela crença de que os colonos são deuses e os colonizados, seres inferiores, que existem para servir aos sangues-azuis. 

Para os colonos, a Amazônia só serve para três fins: construção de hidrelétricas; extração de madeira e mineral; e reserva de caça, pesca e escravos, especialmente para a triste realidade de crianças e mulheres, que, diferentemente do mito das amazonas, são criaturas fracas, subjugadas, escravas compradas à base de comida, de uma boneca, de uma balinha. 

É julho, mês de férias de verão na Amazônia. Enquanto o Festival Gastronômico do Pará e Amapá revela ao mundo a cozinha mais saborosa do planeta, o oceanógrafo, arqueólogo, taxidermista e jornalista João do Bailique, editor da revista Trópico Úmido e que trabalha numa edição especial sobre a Hileia, juntamente com sua esposa, a chefe de cozinha e oceanógrafa Danielle Silvestre Castro, dona do Hotel Caranã, investiga também o tráfico de crianças e mulheres para escravidão sexual. Ambos estão à caça do traficante de crianças e de grude de gurijuba Jules Adolphe Lunier. 

Naquela já distante manhã, na Vila Progresso, Patrícia Valente Melo, 11 anos e seis meses, se levantou da rede e foi ao banheiro, olhou-se ao espelho e apreciou seu rosto, simétrico, olhos imensos, gateados, lábios de rosa vermelha, pele de jambo novo. Era extraordinariamente bonita, e sensual, embora tivesse apenas 11 anos de idade. Tudo aconteceu muito rápido. Um homem peludo entrou na casa, colocou algo no seu nariz e ela acordou em um barco, que, soube mais tarde, se chamava Virgem de Nazaré; levava crianças para a boate Senzala, especializada em servir europeus que atravessavam o rio Oiapoque, oriundos de Caiena. 

O carregamento, meninas sequestradas no Amapá e Pará, seria leiloado com lance inicial de mil euros para usufruto de uma semana, após o que seriam transportadas para Paramaribo. 

– Aquele francês louco, mas que paga muito bem, o tal de Humbert Humbert, já reservou a Patrícia. Ele vem exigindo uma menina assim igual a ela faz tempo. Ele vai pagar nada menos do que 6 mil euros para passar uma semana com ela na propriedade dele na Guiana Francesa, aí então a devolverá para o Caixinha de Pose, que é o dono da boate Senzala, em Oiapoque. Aí a pegarei de volta e a levarei para o Kunathi, por mais mil euros – contabilizou Jules Adolphe Lunier a Tota, capitão do barco. 

A manhã imobilizou-se, tensa como tumor maduro. Um raio chicoteou o céu quase noturno, seguido de trovoada. A tempestade desabou com toda a fúria. Cerca de 40 minutos depois passou completamente e o mar voltou a ficar calmo. Giselle e João do Bailique estavam pescando marlim azul na altura do Cabo Caciporé quando avistaram o ponto flutuando. Aproximaram-se e viram uma menina com salva-vidas, agarrada a um grande banco de madeira. Era Patrícia. 

Seis anos depois, Patrícia Valente Melo olhou-se ao grande espelho do seu quarto e apreciou o rosto, simétrico, olhos imensos, gateados, lábios de rosa vermelha, colombiana, pele de jambo novo. O corpo estava deformado; em vez dos 60 quilos de peso distribuídos em 1,70 metro de altura, seios e quadris enlouquecedores, pernas longas e bem torneadas, estava pesando bem mais, pois deveria parir por aqueles dias. 

Encontrava-se sozinha. O pai já havia saído para a revista Trópico Úmido e a mãe, para o Hotel Caranã. Juntou algumas mudas de roupa numa valise, apetrechos de higiene íntima, documentos, espargiu Chanel 5, chamou um Uber e se mandou para o Caranã, onde chegou poucos minutos depois. Desviou-se da Nave da Catedral, como era conhecido o amplo hall de entrada, e tomou por um caminho lateral, uma alameda de jasmineiros, rumo à marina. 

Nos salões do Hotel Caranã são servidos pratos da mais saborosa culinária do planeta: a paraense. Personagens de ficção misturam-se a personagens reais, vivas e mortas, como o pintor amapaense Olivar Cunha, que decora o cenário do Festival de Gastronomia do Pará e Amapá; o compositor paraense Waldemar Henrique; o filósofo japonês Masaharu Taniguchi; o escritor, astrofísico e médium Laércio Fonseca; o escritor, psicanalista e acupunturista Jorge Bessa; os jornalistas Walmir Botelho e Carlos Mendes; a cantora lírica Carmen Monarcha etc. etc. etc. 

Assim, a Fortaleza de São José de Macapá, maior ícone dos macapaenses, é a tradução perfeita da cidade que se debruça sobre o maior rio do mundo, o Amazonas, na confluência da Linha Imaginária do Equador. Construída por escravos, negros e índios, sob o obsessivo domínio português, para resistir à marinha inglesa, embora só tenha sido atacada por malária, a Fortaleza de São José de Macapá foi o cadinho no qual se forjou a etnia macapaense. 

Os portugueses cruzaram com os africanos e geraram mulatos, e fornicaram com os índios, formando uma população de mamelucos; os africanos misturaram-se com os índios e legaram cafuzos; e mulatos, cafuzos e mamelucos misturaram-se, fechando o círculo, numa diversidade étnica viva nas ruas de Macapá, nas nuances de peles que vão do alabastro ao ébano, passando pelo bronze e jambo maduro, unidos pelo sotaque caboco: a fusão do português falado em Lisboa, doces palavras tupis, línguas africanas, patoá das Guianas, tudo triturado em corruptela. 

Neste romance, a Bacia Amazônia se espraia em vários planos, um dos quais o espiritual. Em segundo plano, surge uma Amazônia pouco conhecida: a dos Ovnis e ETs, com o resgate da Operação Prato, a maior aparição de Ovnis e ETs já registrada no Brasil, documentada pela Aeronáutica, e que se deu na costa do Pará. O que é que os ETs queriam? De onde vieram? E o que significa a data-limite, mencionada por Chico Xavier? 

Em terceiro plano, a Amazônia fica literalmente nua. Todas as questões que vêm sendo discutidas em torno da grande floresta são dissecadas. No caso de uma terceira guerra mundial, que papel a Amazônia teria? Resistiria a uma hecatombe nuclear? Seria ocupada pelos americanos? Também João do Bailique investiga essa questão, bem como analisa a soberania do Brasil sobre a região. 

A Amazônia é mesmo do Brasil? Afinal, o que é a Amazônia? João do Bailique dá as respostas em JAMBU (Clube de Autores e amazon.com.br, Brasília/DF, 190 páginas), meu último romance.

 

RAY CUNHA nasceu em Macapá e trabalhou por mais de uma década como repórter na Amazônia, baseado em Belém, Manaus e Rio Branco. Em Brasília, onde mora atualmente, dedica-se à literatura, jornalismo e à Medicina Tradicional Chinesa, na qual é formado pela Escola Nacional de Acupuntura (ENAc). 

É autor dos romances A CASA AMARELA, A CONFRARIA CABANAGEM, HIENA e FOGO NO CORAÇÃO; dos contos INFERNO VERDE, NA BOCA DO JACARÉ, A GRANDE FARRA, A CAÇA e LATITUDE ZERO; e do livro de poemas DE TÃO AZUL SANGRA.

 

Você pode adquirir JAMBU no site do Clube de Autores, link: 

https://clubedeautores.com.br/livro/jambu

 

Ou na amazona.com.br, link: 

https://www.amazon.com.br/Jambu-Ray-Cunha/dp/1697672590/ref=sr_1_1?__mk_pt_BR=%C3%85M%C3%85%C5%BD%C3%95%C3%91&dchild=1&keywords=Jambu+Ray+Cunha&qid=1629731445&s=books&sr=1-1

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