BRASÍLIA, 14 DE JULHO
DE 2013 – Jessica Rabbit foi a única mulher casada com quem me meti. Eu era
repórter do jornal A Crítica, de
Manaus, e morava sozinho numa casa do pintor Álvaro Pascoa, arranjada pelo meu
amigo José Pereira Gaspar, e que abrigava uma fortuna em telas de Hahnemann
Bacelar. À noite, costumava beber com o poeta Jorge Tufic, do Clube da
Madrugada, no Bar Nathalia, onde enxugávamos garrafas e mais garrafas da
maravilhosa Antarctica manauara. Eu tinha 21 anos; era, por conseguinte, belo e
imortal. Mas Jessica Rabbit se apaixonou por mim por outra razão, ou melhor,
garantiu-me, misteriosamente, que já me conhecia da Península Ibérica, terra
dos seus ancestrais. Só saí do Brasil para ir a Buenos Aires. O fato é que ela
se apaixonou pelo meu texto. Sim, pelo meu texto. Todos os dias, pessoalmente
ou por telefone, eu tinha que apontar para ela todas matérias que eu escrevera,
publicadas no jornal. E queria ler também todos os poemas e contos novos que eu
produzisse.
Jessica Rabbit foi a mulher mais sensual que eu conheci.
Esclareço que não reconheço sensualidade como qualidade, embora não saiba
claramente o que seja. Acho que sensualidade é alguma coisa parecida a um cio
permanente. Ela era ruiva e tinha sardas na pele, tão branca que suas veias
pareciam azuladas. Seus cabelos lembravam a juba de um leão, espalhando-se nas
costas como fios de cobre, e cobrindo-lhe, às vezes, parte do rosto. Suas
sobrancelhas pareciam sempre feitas recentemente e seus olhos, de manhã, eram
azuis celestes, e, à noite, verdes como clorofila. Eu sempre ficava hipnotizado
ao vê-la nua; a cintura era tão estreita que eu acreditava que Jessica carecia
de estômago, embora ela comesse o dobro do que eu comia. Deitada de bruços, nua,
as ancas formavam a mais bela obra de arte, mais bonita até do que rosas
despindo-se ao sol da manhã, e levavam a labirintos, a abismos insondáveis de
mistério, onde eu me perdia inteiramente, montado na luz. Seus seios, túrgidos,
eram aureolados pelos maiores mamilos que já tive a graça de apreciar
longamente, de tocar, cheirar, lamber, segurar desesperadamente, de tentar
engolir, e eles tinham o mesmo sabor dos lábios, da língua e do sexo de
Jéssica: de jambu.
Conhecemo-nos no Amarelinho, que era um bar que ficava na
Avenida Getúlio Vargas, no centro de Manaus. Eu estava com um livrinho, Xarda Misturada, que os poetas José
Edson dos Santos (Joy Edson), José Montoril e eu publicáramos em 1971, em
Macapá. Jessica Rabbit era casada com um empresário americano, do ramo de
turismo, que passava parte do tempo em Miami e a quem ela chamava de “meu
coelho”. Ela tinha mestrado nos Estados Unidos em literatura norte-americana. Começamos
a conversar sobre Ernest Hemingway, William Faulkner, Francis Scott Fitzgerald
e vários outros escritores, ela folhando Xarda
Misturada. Esse livrinho revela as angústias de três garotos de uma cidade
ribeirinha, que tiveram uma visão além do rio Amazonas e da Linha Imaginária do
Equador, por uma porta aberta pelo poeta Isnard Lima Filho. Entrei por essa
porta, peguei a estrada e nunca mais parei. Manaus foi um dos portos de
chegada. No início da madrugada, fui deixá-la a casa.
Quase passei a morar na casa onde Jessica nascera, e de onde
eu podia ver, de madrugada, o Igarapé do 40, bebendo Mateus Rosé e beijando o
corpo todo dela. Às vezes, ela cantava para mim. Poderia ter sido cantora,
atriz, o que quisesse.
Não cheguei a conhecer o coelho, porque ela teve que ir a
Miami, já não me lembro mais por que. Parece-me que o coelho trabalhava com
turismo também nas Bahamas e estava precisando dela, pois Jessica falava
fluentemente, além de português e inglês, francês, italiano, espanhol, alemão,
holandês e russo. O fato é que ela precisou ir, mas garantiu que não se
demoraria. No dia seguinte ao de sua partida meu pai morreu e fui a Macapá, e
depois mudei-me para Belém. Anos depois, soube que Jessica Rabbit se tornara
estrela em Hollywood.
Pô. Parabéns; gostaria de ter conhecido essa Jessica. Você é um afortunado.
ResponderExcluirA última notícia que tive de Jessica Rabbit, ela estava em boas mãos: em 1988, estrelou um filme dirigido por Robert Zemeckis e produzido nada menos que por Steven Spielberg. Não duvido nada de que ela continue o mesmo foguete.
ExcluirEM ULTIMA ANALISE. APOS 'DEGLUTIR' O TEXTO E PERMANECER COLOCADO DENTRO DELE PELO IMAGINARIO. CONCLUO QUE SORTE TEVE
ResponderExcluirJESSICA RABBIT. LIDO E RELIDO O ACIMA ESCRITO DESCONFIO QUE ELA SIM, SE DEU BEM, E SE IMORTALIZOU. L.JORGE.